Ex Improviso

Mínimo sou, mas quando ao Nada empresto a minha elementar realidade, o Nada é só o Resto. Reinaldo Ferreira

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Location: Lisboa, Portugal

Dizem que sou como o sol mas com nuvens como na Cornualha

Wednesday, June 29, 2005

Maria da Conceição

Na festa final de ano lectivo cantámos Maria da Conceição. Umas quadras lindas do nosso folclore que falam de enamoramento.

Os versos são cantados ao som de reco-reco e tambores num ritmo sempre igual, numa cadência repetitiva e seca, o que causa alguma estranheza a ouvidos habituados a variações melódicas de acordes perfeitos de Sol, Si, Ré com que os Beatles cantam Love, love, love me do, you know I love you

Contudo o tal ritmo até se torna cativante se estivermos dispostos a apreciá-lo.


Maria da Conceição


De baixo do rio nascem
Violetas ao comprido
Já me vieram dizer
que queres casar comigo

eu casar contigo sim
mas por ora ainda não
amanhã por estas horas
te darei o sim ou não.

Amor, se queres que eu te escreva
Dá-me a tua direcção:
- eu sou lá da Monsatela,
Maria da Conceição

Maria da Conceição
Oh! Que palavra tão doce!
Dava-te o meu coração
Se o teu ao meu leal fosse.

Debaixo do rio nascem
Violetas amarelas
À porta do meu amor
Está um lindo ramo delas.

Monday, June 27, 2005

Gostas realmente de mim?


( do grande Dali)


Ao dizermos algo a nossa mensagem actua sobre as acções de quem nos ouve, interferindo sobre as suas tomadas de decisão. Quem nos ouve, orienta a sua vida por objectivos de acordo com certos níveis de aspiração. A quê? À sua felicidade, pois claro.

Para atingir esses objectivos a escolha entre uma diversidade de acções possíveis é enorme. Mas, geralmente, maniqueístas que somos, ficamo-nos por duas. Ou branco ou preto. Seja como for, todas as decisões, mesmo sendo só duas, pela incerteza que comportam, implicam margens de risco, pelo que escolhemos sempre o que é preferível para nós. Ninguém gosta de ficar a perder.


Um dia destes, uma amiga contava-me a conversa que tinha tido com o namorado.

Preciso que me digas com toda a sinceridade - disse ele. Gostas realmente de mim?

Ela olhava uma montra de pronto a vestir. Aquele vestido era mesmo giro. A Marta iria morrer de inveja quando o visse vestido nela.

Ela agora olha para ele, para o namorado e não para o vestido. Abre a boca para responder mas a ideia fica parada entre a palavra pensada e a palavra feita.

Não posso responder que não, ele acaba com tudo, vai embora.- pensou ela. E daqui a duas semanas arrependo-me. Não posso responder que sim, ele vai ficar para sempre, e daqui a duas semanas posso ter mudado de ideias.

Pensaste em responder talvez? - Perguntei eu, sempre no meio, na linha limite entre a zona branca e a zona preta à procura de evitar o perigoso risco de cair no abismo por ter feito a escolha errada.

Pensei - respondeu ela. E perante o talvez, precisava de tempo para pensar e decidir.

E o que fizeste? - Perguntei novamente.

Pedi-lhe para repetir a pergunta- respondeu-me.


Leonor
(Este conto é uma ficção. Qualquer semelhança com outra ficção é outra ficção).

Sunday, June 26, 2005

Eu de Porsche Carrera




A diciopédia diz que o automóvel é um veículo de quatro rodas, com motor próprio accionado a gasolina ou a gasóleo., usado no transporte de passageiros ou de mercadorias.

Para os homens, a maior parte deles, o automóvel terá um significado de valor afectivo que para as mulheres não tem. Falo por mim. Não me interessa o modelo e muito menos a cor. Tem quatro rodas, um volante e buzina? Chega!

Eu uso o carro unicamente para me transportar de um lado para o outro. E mesmo assim, pouco. Por duas razões: em primeiro lugar, não contribuo para o consumo desesperado de energias petrolíferas e, em segundo, prefiro que me transportem e assim delego sentidos de orientação e responsabilidades com óleos, escovas de limpa pára brisas, filtros de ar, pneus carecas…

Ah! E quando se fura um pneu?
Mudar um pneu é complicado. Há que saber onde se encontra alojado o sobresselente, onde está o triângulo… ter força para manejar a cruzeta…

Já passei pela experiência inesquecível de um pneu furado quando ia sozinha no carro. Por mais que eu acelerasse este não queria andar. Do travão de mão não era pois estava em baixo, em segunda também não ia… e como se não bastasse o carro não desenvolver a velocidade, toda a gente apitava quando passava por mim…

- O que foi? Queres a estrada só para ti? Que coisa! Ele há cada seca!

Quando finalmente me gritaram:

- O pneu está furado.

- Ahhhhhh! Então é isso.

Parei o carro num sítio com bastante espaço para o arrumar de frente (o estacionamento perfeito). Há quinze anos não havia telemóveis pelo que me dirigi a uma cabine telefónica e chamei o meu marido. Voltei para o carro e sentei-me no lugar do condutor à espera da minha salvação.

Um senhor que me tinha visto chegar mais uma vez me disse:

- Tem o pneu em baixo.
- Já sei. – disse, fingindo que era a coisa mais natural deste mundo.
- E não o muda? – continuou
- Já mudo.

Cerca de meia hora depois chega o meu marido.

- Esqueci-me de dizer-te mas não há sobresselente.- disse eu.

O meu marido suspira. Abre o porta bagagens, levanta o oleado e lá estava o pneu. No modelo Renault 4 o pneu está debaixo do oleado. Não ter descoberto o pneu foi mais humilhante do que admitir que não sabia mudá-lo.

Ao fim de quinze anos já consigo falar no assunto. O que significa que já ultrapassei o trauma.

Mas agora já sei. Seja qual for o modelo de carro hei-de procurar o pneu até no porta luvas. Estacionar um carro é outra história mas essa não conto.

Leonor



Mostrem lá que sabem estacionar um carro carregando

(trabalhem com as teclas do scrol up e scrol down)

Friday, June 24, 2005

Bambolero, bambolera, porque es mi vida y yo la pefiero vivir asi




O Paulo tem 14 anos e é cigano. Já repetiu o 2º ano várias vezes. Comigo fez o 3º ano este ano.
De temperamento emocionalmente instável e de algumas dificuldades de aprendizagem, é portador de um programa educativo individual.

O Paulo levou os dois últimos períodos a entrar e a sair da sala de aula sempre que lhe deu na real vontade. Saía para espairecer do trabalho forçado na aula. Entrava para se lavar da culpa de não lhe apetecer trabalhar. Por outras palavras, dois terços daquilo que poderia ter aprendido reduziu-se a zeros. Todavia, lá evoluiu um pouco, na leitura, trampolim para outros cálculos mentais que ainda não adquiriu.

Passei-lhe sermões a fio que pouco tiveram a ver com o reforço positivo de Piaget ou a tolerância de Brunner. Apesar da paciência dele se esgotar algumas vezes nunca se virou contra mim, física ou verbalmente. Levantava-se e disparava pela porta fora, gritando com leve tom a canção que só os ciganos fazem: Aiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii, mãeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee.

No fim do ano eu disse quem passava e quem não passava. E durante o discurso nunca mencionei o nome dele, pelo que o Paulo, no fim, perguntou-me: e eu, professora?

Decidi fazê-lo sofrer. Para ver se ele apanhava um susto e se com esse susto ele visse que há um tempo para brincar e outro para fingirmos que algumas coisas são a sério.
"O teu caso vai a Conselho Escolar porque eu não te passo. Não posso passar uma pessoa que nunca esforçou." E com a cara mais zangada deste mundo deixei o assunto como encerrado.

Ainda que andasse pesaroso, o Paulo nunca deixou de frequentar as aulas até ao fim, esperando estoicamente pela decisão do Conselho Escolar. No penúltimo dia, passei-lhe não só o último sermão mas também missa cantada.

- Se passares Paulo, reza para que não fiques comigo para o ano porque a partir do momento em que saíres por aquela porta não entras mais. Reza Paulo, reza para não ficares comigo.

- Rezo sim professora, para ficar consigo outra vez.

As lágrimas apareceram nos nossos olhos. Mas a socialização faz-se devagarinho num processo de água mole em pedra dura no coração dos indivíduos, deixando marcas de conduta contraditória à nossa intenção e, assim, ambos baixámos os olhos para os nossos sapatos para não vermos a comoção um do outro porque um homem não chora e as professoras não podem ver um homem a chorar.



Leonor

Wednesday, June 22, 2005

O Barco vai de saída



(a pintura é da nossa Betty Branco Martins do Fragmentos)

Não sou uma pessoa que valoriza sempre o seu bairro ou a sua terra natal sobre os outros.
Entendo que entre Iberos, Celtas, Romanos, Árabes, Judeus somos todos Lusitanos. Portugal é uno na sua diversidade cultural. Aliás, quem já me conhece sabe que promovo qualquer terra do meu país como se fosse minha de nascimento.

Não sou bairrista. Mas, provavelmente, sou chauvinista. É só uma questão de mudar a raiz da palavra, deixando o mesmo sufixo.

Diferentes significantes, diria Saussure. Diferentes significados, diria Wittgenstein. E todos têm razão.



(ainda da Betty)

O barco vai de saída
Adeus ao cais de Alfama
Se agora ou de partida
Levo-te comigo ó cana verde
Lembra-te de mim ó meu amor
Lembra-te de mim nesta aventura
P'ra lá da loucura
P'ra lá do Equador

Ah mas que ingrata ventura
Bem me posso queixar
da Pátria a pouca fartura
Cheia de mágoas ai quebra-mar
Com tantos perigos ai minha vida
Com tantos medos e sobressaltos
Que eu já vou aos saltos
Que eu vou de fugida

Sem contar essa história escondida
Por servir de criado essa senhora
Serviu-se ela também tão sedutora
Foi pecado
Foi pecado
E foi pecado sim senhor
Que vida boa era a de Lisboa

Gingão de roda batida
corsário sem cruzado
ao som do baile mandado
em terra de pimenta e maravilha
com sonhos de prata e fantasia
com sonhos da cor do arco-íris
desvaira se os vires
desvairas magias

Já tenho a vela enfunada
marrano sem vergonha
judeu sem coisa nem fronha
vou de viagem ai que largada
só vejo cores ai que alegria
só vejo piratas e tesouros
são pratas, são ouros,
são noites, são dias

Vou no espantoso trono das águas
vou no tremendo assopro dos ventos
vou por cima dos meus pensamentos
arrepia
arrepia
e arrepia sim senhor
que vida boa era a de Lisboa

O mar das águas ardendo
o delírio do céu
a fúria do barlavento
arreia a vela e vai marujo ao leme
vira o barco e cai marujo ao mar
vira o barco na curva da morte
e olha a minha sorte
e olha o meu azar

e depois do barco virado
grandes urros e gritos
na salvação dos aflitoses
tala, mata, agarra, ai quem me ajuda
reza, implora, escapa, ai que pagode
rezam tremem heróis e eunucos
são mouros são turcos
são mouros acode!

Aquilo é uma tempestade medonha
aquilo vai p'ra lá do que é eterno
aquilo era o retrato do inferno
vai ao fundovai ao fundo
e vai ao fundo sim senhor
que vida boa era a de Lisboa.


Letra e Música de Fausto

Monday, June 20, 2005

No creo em brujas pero que las hay… las hay



Nos meses de Junho a Agosto são comuns em Portugal as festas nas localidades, as romarias, quase todas elas com carácter religioso. Á parte o lado sagrado da festa representado geralmente na procissão, a feira, o lado profano, torna-se irresistível à libertação do espírito perante os sacríficios feitos.

A feira atrai pela sua diversidade de artigos expostos. Vende-se de tudo. Desde relógios Cartier a farturas.

Ao passear pelas bancas, deparei-me com uma, cuja vendedora era uma bruxa. Ela vendia pedras para a fortuna, para afastar a inveja, bruxinhas da sorte… contudo o que me atraiu a atenção foi um pote de ferro totalmente enegrecido com umas bolas de corda e uma colher de pau no interior.

Quis saber o que era aquilo mas um pouco a medo vacilei e engoli a pergunta. Todavia, ela era uma bruxa esperta. Percebeu pela minha expressão de indiscrição meia infantil que eu tinha achado aquela banca engraçada e aquele pote curioso.

- Pode espreitar se quiser – disse ela. – não tem cobras nem lagartos.

Sorri pela rapidez da resposta. Continuei com os gestos atados pelas convenções. Afinal ela era uma bruxa, tratava com as coisas do desconhecido. E nós temos por hábito só acreditar nas fadas.

- Eu estou vestida de preto mas aqui só se faz magia branca, magia para o bem. Nesse pote está reservado o que mais anseia no momento.

Continuei a sorrir-lhe. No entanto, fui embora. Ao fim de quatro passos voltei atrás com um sorriso de orelha a orelha. Ela percebeu que eu tinha ficado com aquele bichinho curioso de saber o que o futuro me reservava. Ela era um bruxa esperta. Mexi as bolas com a colher de pau. Tirei uma.

A felicidade!

- A felicidade está em todo o lado. A felicidade está em todas as coisas. Ela sempre existe à nossa volta. Temos de percebê-la e usufruí-la. Vou-lhe dar esta pedra, é uma pedra rolada de rio que rolou muito até chegar às suas mãos. Ela esteve sempre guardada para si e guarda a sabedoria de perceber os momentos felizes. A partir de agora as suas tristezas acabaram. – disse ela.

É uma pedra preta, pequena, ligeiramente achatada, macia ao toque, uma pedra vulgar, que para mim tem o encanto negro e vidrado de uma obsidiana.

Gostei daquela bruxa. Admirei o seu discurso seguro e fluente. Maravilhei-me com a sua postura de bruxa assumida com o trabalho de casa bem preparado. Mas sobretudo gostei da sua perspicácia em perceber a minha vontade de agarrar a ponta feliz do fio de cada momento.

Guardei a pedra do rio. Nunca se sabe… porque eu não creio em bruxas mas que as há, há.


Leonor

Sunday, June 19, 2005

Os acasos não se explicam



Num encontro de alguns amigos já conhecidos e de outros ainda por conhecer, a pessoa sentada ao meu lado na mesa do restaurante, amiga por conhecer, dirigia-me uma pergunta, iniciando o que viria a ser uma grande descoberta entre nós duas.

Não me lembro da pergunta mas lembro-me que pelo meio da conversa, surgiu o grande tema que domina a actualidade de grandes e pequenos, ricos e pobres, brancos e negros: o blog.

Eu tenho um blog.
Eu também.
Como se chama o teu?
Eximproviso. Lá eu sou a Leonoreta.
Ah! Eu conheço-te do Lobices.
Sim?!!! Quem és tu?
Eu sou a Mitsou. Do Tijolices.

Que maravilha! Se tivéssemos combinado não teria sido melhor.
E entre muitas coisas continuámos a falar de blogs.


Leonor

Tuesday, June 14, 2005

Perdi o campeonato


A festa de fim de ano lectivo começou no dia 1 de Junho. As actividades lúdicas têm sido distribuídas ao longo do mês.

O torneio de futebol entre turmas já começou e já acabou. Entre escolher o capitão de turma, o jogador que ficava na defesa, na baliza, no ataque e ainda quem ficava no banco para as substituições até chegarmos à final, passaram duas semanas a voar.

Facilmente fomos passando de eliminatória em eliminatória com classificações de dez a zero, onze a zero, doze a zero… até ao jogo da meia final que nos levaria ao campeonato a realizar-se no último dia de aulas, se ganhássemos.

Os resultados obtidos ao longo dos jogos estavam a colocar o nosso ego acima da média da modéstia disfarçada. Contudo perdemos a meia final. Os meus jogadores ficaram prostrados no chão, quais Ronaldo, Figo, Beto, olhavam para mim envergonhados. E de certo modo, medrosos porque antes tinha-lhes dito que se perdessem o jogo os chumbaria a todos.

Chegados à sala foi tempo para descansar e numa espécie de mesa redonda soltei o discurso do mau dançarino que diz que o chão da sala está torto.

- Calma! Perdemos porque alguém tinha de perder.
- Sim!
- Um dia é da caça e o outro é do caçador.
- Sim.
- Há mais marés que marinheiros.
- Não está triste professora?
- Não. Claro que não. Nós perdemos mas jogámos bem.
- Sim.
- Participámos com empenho, por amor à camisola que é o mais bonito que há.

Mandei-os para o recreio mais cedo. Já iam mais animados. Aquele discurso tinha sido mais para me convencer a mim do que para convencê-los a eles.
Naquela altura uma colega telefonou-me.
- Estás boa?
- Ahhhhhhhh, acabo de perder o campeonato de futebol. Estou de rastos.
- Bem feita. Queres os troféus todos só para ti.

Na sala dos professores, qual Luís Campos, humilhado pela derrota dos seus jogadores, tive de enfrentar a treinadora da equipa vencedora, qual José Mourinho, com ar triunfante.

Isto foi tudo a brincar, mas penso naqueles homens do futebol a sério que sofrem derrotas a sério e humilhações a sério.

Aiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii! Perdi o Campeonato.


Leonor

Sunday, June 12, 2005

Este vate que me tem cativa


O concelho de Constância está situado na confluência dos rios Tejo e Zêzere, integrando a sub-região do Médio Tejo, bem como em termos turísticos, a Região de Turismo do Ribatejo. É limitado a norte e a nascente pelo concelho de Abrantes, a sul pelo concelho da Chamusca, e a poente por este último e por Vila Nova da Barquinha.

Em Constância, viveu o meu grande poeta que me ensinou a amar a minha língua materna através de jogos de palavras entrelaçadas em perífrases, hipérboles e hipérbatos, numa construção semântica que coloca todo o meu sentir na grande amplitude que é o homem como parte integrante do universo.

Desde o dia 10 de Junho até ao domingo seguinte, festejam-se em Constância as “Pomonas Camonianas”. Inventa-se uma feira medieval e as crianças da terra participam activamente em espectáculos.



Fazia calor. Eu transpirava. Imagino o pagem e a donzela dentro daqueles veludos. Mas, mudam-se os tempos… mudam-se os climas. Pois… naquela altura, na Idade Média e mesmo depois no Renascimento, as grandes potências mundiais ainda não tinham esburacado a camada de ozono com as suas experiências nucleares e o clima devia ser mais ameno.

Mas o que é que eu estou para aqui a dizer…!? Este desabafo é para outro post!!!




Uma vez o meu filho perguntou-me:
mãe, na feira quinhentista vende-se tudos a quinhentos?
(ainda estávamos na época do escudo).


Eu e o meu poeta em Constância

Luís,
Não tenho o misticismo de Bárbara
Nem a angelitude de Laura
Nem a amenidade de Lianor

Sou a Leonoreta
Que na lambreta
vai destemida
pela estrada preta.



"Avíçaras, capitão,
Meu capitão general!
Já vejo terra de Espanha,
Areias de Portugal.
Mais enxergo três meninas
Debaixo de um laranjal:
Uma sentada a coser,
Outra na roca a fiar,
A mais formosa de todas
Está no meio a chorar".

(In A Nau Catrineta)



O sítio, lindo, bastante arborizado, onde convergem as águas verdes do rio Zêzere e as águas azuis do rio Tejo.



Foi mais uma reportagem da Repórter X. (rssssssssssssssssssssssssssssssss)

Friday, June 10, 2005

Luís, o poeta, salva a nado o poema


Camões cantou a Pátria Portuguesa e muitos poetas portugueses cantaram Camões. De todos eles, desta vez, escolhi Almada Negreiros.


Era uma vez
um português
de Portugal.

O nome Luís
há-de bastar
toda a nação
ouviu falar.

Estala a guerra
e Portugal
chama Luís
para embarcar.

Na guerra andou
a guerrear
e perde um olho
por Portugal.

Livre da morte
pôs-se a contar
o que sabia
de Portugal.

Dias e dias
grande pensar
juntou Luís
a recordar.
Ficou um livro
ao terminar.

muito importante
para estudar:
Ia num barco
ia no mar
e a tormenta
vá d'estalar.

Mais do que a vida
há-de guardar
o barco a pique
Luís a nadar.

Fora da água
um braço no ar
na mão o livro
há-de salvar.

Nada que nada
sempre a nadar
livro perdido
no alto mar.

_ Mar ignorante
que queres roubar?
A minha vida
ou este cantar?
A vida é minha
ta posso dar
mas este livro
há-de ficar.

Estas palavras
hão-de durar
por minha vida
quero jurar.
Tira-me as forças
podes matar
a minha alma
sabe voar.

Sou português
de Portugal
depois de morto
não vou mudar.

Sou português
de Portugal
acaba a vida
e sigo igual.

Meu corpo é Terra
de Portugal
e morto é ilha
no alto mar.

Há portugueses
a navegar
por sobre as ondas
me hão-de achar.

A vida morta
aqui a boiar
mas não o livro
se há-de molhar.

Estas palavras
vão alegrar
a minha gente
de um só pensar.

À nossa terra
irão parar
lá toda a gente
há-de gostar.

Só uma coisa
vão olvidar
o seu autor
aqui a nadar.

É fado nosso
é nacional
não há portugueses
há Portugal.

Saudades tenho
mil e sem par
saudade é vida
sem se lograr.

A minha vida
vai acabar
mas estes versos
hão-de gravar.

O livro é este
é este o canto
assim se pensa
em Portugal.

Depois de pronto
faltava dar
a minha vida
para o salvar.

Na época Renascentista era costume os fidalgos oferecerem às suas paixões quadras ou poemas encomendados aos poetas. Um fidalgo de Cascais prometeu a Camões seis galinhas em troca de um poema mas só lhe pagou com meia e o grande poeta respondeu-lhe assim:

"Cinco galinhas e meia

deve o senhor de Cascais

e a meia, vinha cheia

de apetite para as mais"

Wednesday, June 08, 2005

A Malta das Naus




Poema da Malta das Naus

Lancei ao mar um madeiro,
espetei-lhe um pau e um lençol.
Com palpite marinheiro
medi a altura do sol.

Deu-me o vento de feição,
levou-me ao cabo do mundo.
Pelote de vagabundo,
rebotalho de gibão.

Dormi no dorso das vagas,
pasmei na orla das praias,
arreneguei, roguei pragas,
mordi peloiros e zagaias.

Chamusquei o pêlo hirsuto,
tive o corpo em chagas vivas,
estalaram-me as gengivas,
apodreci de escorbuto.

Com a mão direita benzi-me,
com a direita esganei.
Mil vezes no chão, bati-me,
outras mil me levantei.

Meu riso de dentes podres
ecoou nas sete partidas.
Fundei cidades e vidas,
rompi as arcas e os odres.

Tremi no escuro da selva,
alambique de suores.
Estendi na areia e na relva
mulheres de todas as cores.

Moldei as chaves do mundo
a que outros chamaram seu,
mas quem mergulhou no fundo
Do sonho, esse, fui eu.

O meu sabor é diferente.
Provo-me e saibo-me a sal.
Não se nasce impunemente
nas praias de Portugal.

In Teatro do Mundo, 1958, de António Gedeão


Só por curiosidade:




Características das caravelas e das naus Portuguesas


Caravelas Portuguesas:
- de 20 a 30 metros de comprimento e de 6 a 8 de largura;
- capacidade para 50 toneladas;
- percorriam com o vento a favor, cerca de 250 km por dia;
- utilizavam as chamadas velas latinas, triangulares que eram erguidas em dois ou três mastros; - pouca carga;
- tripulação de 40 a 50 homens;
- habilidade de zarpar rapidamente.


Naus Portuguesas:
- maiores do que as caravelas e mais lentas;
- capacidade de tonelagem maior, a de Cabral tinha 250 toneladas;
- maior tripulação, como a de Cabral que tinha 190 homens;
- utilizadas para transportar mercadorias.


(*) Fonte: Revista Veja, Ed. Especial sobre o Descobrimento nº 17, pág.48/49.

Sunday, June 05, 2005

O Valor de Sapo




A maior parte dos meus alunos são de etnia cigana. Os restantes repartem-se pelas etnias africana e lusa.

Noutro dia, contava a história da Polegarzinha… “então a menina foi raptada para casar com um grande sapo”… quando o grito do Bruno me interrompeu. Aflito, segurava a cabeça com as duas mãos.

- Ai professora! Não diga isso!

- O quê? – perguntei. Os outros miudos ciganos perceberam logo a angústia do colega.

- Professora, esse animal é mau para os ciganos. – explicou o António, irmão do Bruno. Este, ainda tinha as mãos na cabeça.

Uma coisa engraçada que acontece nas escolas situadas em bairros carenciados é termos nas salas famílias inteiras, irmãos, meios irmãos, primos e meios primos tanto da parte da mãe, do pai, como da madrasta e do padrasto. Mas este é um pequeno aparte que não interessa para aqui agora.

Claro! Eu já sabia. O sapo é o “coisa ruim” dos ciganos. Como é que eu não me lembrei?

Sempre vi, desde pequena, nos estabelecimentos comerciais o referido sapo, em barro pintado e envernizado de tamanho XL para as incompatibilidades sociais do dono da casa serem bem visíveis pelos ciganos.

- Então como se diz? – perguntei novamente.
- A gente não diz…
- Desculpa, mas não me lembrei.

O Bruno, o miúdo cigano de sete anos, que me trata sempre tão bem, que amua quando grito com ele, que trabalha o dia inteiro para eu lhe colocar “certinhos” no caderno, percebeu o meu profundo abatimento de ânimo por ter invadido negativamente o campo sagrado dos seus valores, embora sem querer, porque na minha cultura um sapo é um animal que ajuda a manter o ecosistema dos pântanos e, na minha fantasia livresca, um Princípe encantado, e logo me quis animar dizendo:

- Pode dizer professora. – disse ele.
- Não. Não se pode , não se diz. – disse eu.
- Professora! – diz a Jessica, cigana também, com a alegria estampada no rosto de quem tinha descoberto a pólvora – diga rã.

Concordámos todos contentes com a ideia da Jessica, rindo, como diria a Alice vieira, em todas as vogais do alfabeto e continuámos a história.


Leonor

Thursday, June 02, 2005

Pedi Papper

O dia da criança nas escolas é dia de passeata. Das diversas actividades para fazer nesse dia, afixadas no placard na sala dos professores, escolhi para a minha turma um pedi papper.

Foi o máximo. Eu adorei. Eles adoraram. Eu adorei porque eles adoraram. Eles adoraram porque eu adorei. Ficámos em primeiro lugar em relação às outras turmas de escolas que também participaram. Trouxemos para a escola um troféu que iremos exibir na exposição de fim de ano.




Visitámos o Complexo 2 dos Olivais. O sítio de onde parte a limpeza da cidade de Lisboa. Tem cerca de mil viaturas, segundo o guia.




Dividimos a nossa turma em dois grupos. Metade ficou comigo. A outra metade com uma auxiliar.




Todos os dias os camiões que fazem a recolha do lixo são lavados com creolina a altas temperaturas. É bom saber destas coisas. As perguntas choviam. Mas o guia tinha muita paciência.




Também visitámos as instalações por dentro. Tem uma oficina de mecânica onde se faz a manutenção das viaturas. E um armazém de pneus que mete medo. Os escritórios estão divididos por gabinetes.


O Bruno e o André

Terminada a visita às instalações saímos do complexo e começámos o pedi papper. Uma catrefada de folhas para responder e de ruas para percorrer esperava por nós. E eu, qual Condestável Nuno Álvares Pereira, influenciado pelas literaturas de Cavalaria de Amadis de Gaula, à frente das suas tropas gritando para os castelhanos, corria mais depressa que alguns dos miudos.




A biblioteca dos Olivais, uma das descobertas. Estávamos no caminho certo.


A Professora

Atravessámos passadeiras, passagens aéreas, estradas, descobrimos ruas, virando à esquerda e à direita, muitos ficaram a saber o que era um coreto e para que servia uma harpa.

- No cimo dessa rua existe uma igreja.
- Já vejo a torre
- Diz o nome dos santos que estão representados em azulejo.

O André estava com o rosto a arder e a franja toda puxada para cima como o Tintim de tanto limpar o suor da testa com a mão.

- Então quais são? Não trouxe os óculos e não vejo os nomes… - disse eu.
- Virgem Maria e Santo António – disse o André.
- Tá maluco????!!!! – eu tinha visto que era São José.
- Enganei-me, enganei-me.





Chegámos mais mortos que vivos. Muitos mandaram-se para cima da relva. O outro grupo juntou-se logo a seguir. Trocámos experiências. “ e aquela parte ali…”

Os troféus eram pequenos robots feitos de peças de automóveis pintados de dourado.

- É ouro professora?
- Mais ou menos.
- eram todos todos iguais… - disse o Bruno desolado.
- Parecidos. O nosso á mais bonito.- disse com a maior convicção do mundo.
- yah! O nosso é mais bonito.



Leonor

Wednesday, June 01, 2005

Convenção dos Direitos da Criança



A convenção sobre os Direitos da Criança foi adoptada pelas Nações Unidas a 20 de Novembro de 1989. Portugal ratificou a Convenção em 21 de Setembro de 1990.

O documento que enuncia um vasto conjunto de direitos civis, sociais e culturais de todas as crianças tem um carácter universal e é ratificado por 192 estados do mundo e compõe-se de 54 artigos que se dividem principalmente em quatro grandes categorias, nomeadamente:

- Os direitos à sobrevivência
- Os direitos relativos ao desenvolvimento
- Os direitos relativos à protecção
- Os direitos de participação

Estes direitos relacionam-se directamente com:

A não descriminação que significa que todas as crianças têm o direito de desenvolver o seu potencial em todas as circunstâncias em qualquer parte do mundo.
O interesse superior da criança que deve ser uma consideração prioritária em todas as acções e decisões que lhe digam respeito.

A sobrevivência e o desenvolvimento sublinhando a importância vital de garantia de acesso a serviços básicos e igualdade de oportunidades para que as crianças possam desenvolver-se plenamente.

A opinião da criança que significa que todas as crianças deve ser ouvida e tida em conta.


(texto adaptado por mim retirado de uma publicação distribuída pela Câmara Municipal de Lisboa)



“Quando eu era um rapazinho ver um avião era um grande acontecimento . O mesmo acontecia com receber uma chamada telefónica de uma cidade situada a alguns quilómetros de distância. Não tínhamos televisão e nem sequer havíamos ouvido falar de computadores. Isto passou-se há apenas cinquenta anos.”

Kofi Annan