Ex Improviso

Mínimo sou, mas quando ao Nada empresto a minha elementar realidade, o Nada é só o Resto. Reinaldo Ferreira

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Dizem que sou como o sol mas com nuvens como na Cornualha

Sunday, March 07, 2010

Aproveito para um post

JMC
O meu blog fez cinco anos.

Cinco anos já!!!
Atrevo-me a dizer um cliché. como o tempo passa. Parece que foi ontem.

Mais do que falta de tempo para vir aqui arrumar palavras na loja, sobre acontecimentos vividos ou coisas pensadas, é a falta de vontade para continuar com algo que em tempos me prenchia grande parte do meu tempo livre.
Outras coisas arranjei. Novidades para experimentar. Desafios para ultrapassar. Metas para alcançar.
Experimentei. Ultrapassei. Alcancei.
Até que um dia, tal como o blog, eu adiarei a experiencia que vivo no momento - acabar de vez não - em prol de outras novidades.
É um espírito insatisfeito este que trago no corpo que não me deixa quieta até o dia que for o últi mo.
Agradeço-lhe JMC a sua fidelidade leitora ao meu blog.
Leonoreta

Sunday, December 13, 2009

O natal dos 3 porquinhos

Depois de ver este vídeo constatei que o meu pasmo era igual ao das renas.

Leonoreta

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Thursday, October 08, 2009

Ninguém é santo

Já estão no 3º ano. Cresceram depressa. Parece que foi ontem que entraram para o 1º ano e o Bruno, ainda com cinco anos, entrava a chorar pela sala a pedir-me a chucha.
Na sala de aula portam-se bem. Perceberam, desde muito cedo, quem é a autoridade. Mas, de vez em quando, os mais afoitos, que são a minoria, arriscam uma fuga à regra. Ninguém é santo.
Lá fora, no recreio e no refeitório a conversa é outra. Principalmente com os rapazes. O David é o mais atrevido. Auxiliares e alunos fazem-me queixa dele. Apelo ao voluntariado do arrependimento mas não resulta. Passamos ao recrutamento das boas atitudes, trocando as más acções pelos intervalos.
Isso dói. Ficar retido na sala de aula a pensar que seria muito melhor estar lá fora a fazer das suas………..
Hoje perguntei ao David assim que começou a última parte da aula:
- Então David, portámo-nos bem no refeitório?
- Sim. – respondeu o David.
O Bruno soltou um Oh, olhando na direcção do David. Vi logo que afinal as coisas não correram muito bem.
O David tinha dito uma asneira à mesa.
- Qual? – perguntei eu.
- Aquela parte das meninas. – respondeu o Bruno
Leonoreta

Monday, August 03, 2009

Reforço positivo

As aulas já acabaram há um mês e já tenho saudades do reboliço da sala de aula.
Ao fazer a arrumação habitual de fichas utilizadas ao longo do ano lectivo deparei-me com uma série de desenhos, ofertas diárias dos meus alunos. A maior parte eram da Teresa que sempre que eu lhe dava um bom me gratificava com uma ilustração da sua autoria. Quando eu lhe dava um muito bom depositava-me em silêncio um rebuçado de fruta em cima da minha secretária.

Aqui, Skinner, o reforço positivo era dado a mim pela minha aluna. “Levas desenho e rebuçado se me deres boas notas, caso contrário….”. como é que explicas isso?

Tenho saudades daquele reboliço.

Leonoreta

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Saturday, June 06, 2009

Vou rezar todos os dias

A Maria perguntou-me quando é que eu dizia quem é que passava ou não de ano.
- No último dia. Já sabes disso. - disse eu.
- E a professora já sabe quem vai passar?
- Isso depende de como eu acordar nesse dia. Se u acordar bem disposta passam todos. Se eu acordar mal disposta chumbo toda a gente.
- Ai! Então vou rezar todos os dias.

E diariamente tem-me perguntado como tenho acordado. Bem! digo eu e ela diz-me que tem rezado.
Ainda me expulsam por anti pedagogia.

Leonoreta

Friday, April 10, 2009

Relembrando Eça

Ha tempos o meu caro amigo JMC deixou num dos seus comentários uma frase excelente, actualissima nos tempos de hoje e, aproveitando-me da oportunidade dada, assim a publico.

'Os politicos e as fraldas devem ser mudados frequentemente e pela mesma razão'. - Eça de Queiroz


e é assim a vida.

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Sunday, March 15, 2009

Marx avisou mas ninguém ligou

"Os donos do capital vão estimular a classe trabalhadora a comprar bens caros, casas e tecnologia, fazendo-os dever cada vez mais, até que se torne insuportável. O débito não pago levará os bancos à falência, que terão que ser nacionalizados pelo Estado"

Karl Marx, in Das Kapital, 1867

Friday, January 30, 2009

Onde arranjar metáforas?

Entende-se por trabalho cientifico uma pesquisa que seja exequível, pertinente, feita com rigor e que objective a cientificidade.

O trabalho cientifico implica uma parte teórica (fundamentada por autores de gabarito, de preferência, para mostrarmos que andamos por dentro do assunto) e outra empírica ( a nossa observação no terreno, in locco).

Formulem uma hipótese do tipo – isto se a pesquisa for em biologia marinha – será que as alforrecas cospem para o ar num mar infestado por tubarões?

Vão à livraria ou digitem no Google e vejam quem já escreveu sobre o assunto. E não se espantem de ver a quantidade de estudos que já existem sobre o assunto. Sobretudo não desanimem.

Leiam. Leiam sempre mesmo quando já perceberam que já leram bastante. Continuem a ler. Nunca parem.

Simultaneamente, comecem a vossa observação. Caracterizem a vossa amostra. Pensem no modo de lhes sacar informação e no modo de analisar essa informação. Isto, no caso da amostra ser gente e conseguir falar. No caso das alforrecas será difícil. Suponho eu que entra aqui o conceito de exequibilidade. (sempre que digo esta palavra enrolo a língua quando chego ao “bi”)

Redijam o trabalho com frases curtas. como diz Umberto Eco, deixem as frases longas para o Proust. Lógicas rápidas. Isto é, uma variável tem de justificar a outra. Ou não. E se não, justifiquem-no nas conclusões.

A somar a isto tudo que tem de ser feito com prazos há a relação com o orientador. Da primeira sessão conjunta de trabalho surge a primeira emenda. Da segunda sessão, surge a emenda da emenda. Da terceira sessão, surge a emenda da emenda da emenda.

E nesta altura começam a questionar-se sobre a pertinência do vosso trabalho e a verem que já deixaram de ver quatro estreias no cinema.

Tudo tem um começo, um meio e um fim.

Finito.

Conclui, pela investigação feita que para além da hipótese formulada, o trabalho científico mata a metáfora.

E porque as metáforas morreram em mim estou nesta crise do não conseguir escrever e fico, assim meio apática a olhar o teclado e o papel branco..

Obstinada como sou, tenho de procurar metáforas.

Leonoreta

Friday, January 02, 2009

Esperar é uma virtude

Entro sempre no novo ano com alguma apreensão. Não porque tenha medo do que ele possa trazer-me de negativo – penso que é um receio razoável de qualquer ser humano que tem por objectivo ser feliz – até porque quando faço o balanço verifico sempre que o saldo foi positivo.

Então, se o saldo é sempre positivo, porquê a apreensão dos dias por vir?

Trata-se de um ano novinho em folha por estrear que Quino, o autor de Mafalda comparava a um bloco de folhas em branco que teríamos de ir escrevendo com uma caligrafia apurada para não borrarmos a escrita.

Ora bem!

Numa perspectiva existencialista, mais dia menos dia ou, mais folha menos folha, lá estamos nós a cometer erros, sejam eles de ortografia, sintaxe ou semântica.

Estou a falar em sentido figurado já se vê. Os erros, propriamente ditos, são erros de conduta: atitudes e comportamentos, inconscientes ou não.

Numa perspectiva determinista o Grande Mudo que tudo tem planeado para mim em dias e horas certas certos mas que entende que eu não tenho que saber nada a não ser no momento exacto, deixando-me pensar que as escolhas são minhas.

E o que tem ele planeado para mim este ano?
É o não saber que me deixa apreensiva.
E se eu soubesse?
Mas Ele não quer que eu sofra por antecipação, seja por uma coisa boa ou uma coisa má e, assim, até que aconteça seja o que for só saberei na altura.

Afinal, esperar é uma virtude.
Leonoreta

Friday, November 28, 2008

Aprender uma língua


Começamos o dia com Matemática.
Dois quadrados de cartolina verde para dividir ao meio: quatro triângulos equiláteros.
Os alunos montaram uma árvore de natal sobrepondo os triângulos na vertical numa folha de papel cavalinho.

A instrução no quadro dizia:
agora decorem a árvore com :
- meia dúzia de pinhas
- uma dúzia de bolinhas
- meia dezena de presentes
- uma dezena de sinos

Nichita, que integrou a turma em Abril, vindo directamente da Moldávia sem saber uma palavra de português, lá vai na aprendizagem da sua segunda língua de vento em popa.
Diariamente faz perguntas num sotaque romeno acentuadíssimo:
- Professora – perguntou hoje – o que é pinhas?

Desenhei um pinheiro – nunca desenhei tanto na vida – e, no meu traço desajeitado para o desenho, fiz algumas pinhas.

A Bruna lembrou-se que os campos da escola tinham pinhas e foi buscar uma para o Nichita ver.

Acabamos o dia com Língua Portuguesa.
“O gato tem medo do pato. O pato tem medo do gato. O rato tem medo do rato e o pardal não tem medo de ninguém” (mas quem é que escreve estas coisas para os miúdos?)
- Professora, o que é pardal? – perguntou o Nichita.
- É um pássaro. - respondi-lhe eu.

“Olha, queres ver que ainda temos de ir lá fora procurar um pardal?”, Comentou o David mais ou menos em voz baixa.
Leonoreta

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Friday, October 31, 2008

O remador é um incompetente

Quando ingressei na universidade, logo na primeira aula, uma das muitas professoras que iria ter durante os quatro anos que durou o curso, disse-nos, a mim e aos meus colegas: “escolheram educação. Em educação as coisas mudam todos os dias.”

Pensei que a professora estivesse a exagerar. Afinal, passados alguns anos, constato que tinha razão.

E contudo o que muda exactamente em educação?
É a forma ou o conteúdo?
As duas coisas ou nenhuma delas?
Ah! Agora poderia dissertar sobre o assunto até não saber mais o que dizer. Mas não vou por aí.

As mudanças espalhafatosas lembram-me sempre uma história que passo a contar.

Com a finalidade de estreitar os laços entre duas empresas, sendo uma delas portuguesa e outra japonesa, foi decidido realizar-se anualmente uma prova de remo.

Na primeira competição, os japoneses destacaram-se desde o primeiro instante. Chegaram à meta em primeiro lugar. A equipa portuguesa chegou uma hora depois.

A direcção portuguesa reuniu-se para analisar os resultados de tão desastrosa derrota e concluiu que a equipa japonesa era composta por um chefe de equipa e dez remadores enquanto que na equipa portuguesa havia um remador e dez chefes de equipa.

No ano seguinte, a equipa japonesa destaca-se mais uma vez chegando em primeiro lugar à meta. Desta vez a equipa portuguesa chegou duas horas depois.

A direcção reúne novamente e constata que a equipa japonesa possui um chefe de equipe e dez remadores enquanto que a equipa portuguesa, com as medidas tomadas após o fracasso do ano transacto, era constituída por um chefe de serviço, dois acessores da gerência, sete chefes de secção e um remador.

Pelo que se concluiu por unanimidade que o remador era um incompetente.

Leonoreta

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Friday, October 17, 2008

Ralhar não dói

Ensino as vogais, as consoantes, os ditongos, as unidades, as dezenas e as centenas, o “e vai um”, os meses do não e os dias da semana.
E penso… como é que eu aprendi isto tudo? Quero dizer… que método usou a minha professora para me ensinar essas coisas? Porque nessa altura ainda não se falava no lúdico. A didáctica era feita basicamente a reguadas. Estas não eram anti pedagógicas e quem as levou parece exibir uma espécie de orgulho por tê-las levado. Não ficaram traumas.

Em quatro anos de escola primária levei uma reguada. Injustamente. Deixei cair um lápis a meio de uma explicação da professora.

A régua tinha usos muito abrangentes. Além de controlar comportamentos desviantes, de distinguir classes sociais, era também o “apoio educativo” e o “ensino especial”para dificuldades de aprendizagem.

Ainda bem que a régua desapareceu dos estabelecimentos escolares pelo seu uso indevido.

Contudo, verificando-se actualmente que houve um salto da indisciplina para a violência na escola, que afecta bastante a relação pedagógica, algo mais será preciso que o simples sermão porque ralhar não dói.
Leonoreta

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Saturday, October 04, 2008

Escrever também cansa

Quem corre por gosto não se cansa, diz o povo.

Mas eu lembro-me das palavras de José Régio: “viver também cansa”.
Logo, correr também cansa. Mesmo que seja por gosto.

Esta conversa toda para dizer que, apesar de ter feito aquele trabalho, dito de carácter científico, ao qual dediquei um ano de leituras especificas e de escritas afins (perde-se o jeito às metáforas) com gosto (e alguns desgostos) estou cansada.

Não consigo escrever nada. Não arranjo assunto.
Apenas passo os olhos pelo que vocês escrevem.
De modo que… espero que os pingos de chuva de Outono me tragam alguma inspiração.

Leonoreta

Friday, September 19, 2008

A primeira vez

Pela primeira vez comecei um ano lectivo na mesma escola com os mesmos alunos e com a maior parte dos colegas do ano anterior.

E há, sem dúvida, uma diferença muito grande.
Este ano não sonhei com portas sem número, medo consciente de me perder nos caminhos para chegar à nova escola. Não tive de descobrir transportes e adaptar-me a novos horários de saída e entrada em casa.

Não tive de me apresentar a novas colegas e descobrir que temperamentos teria pela frente. E sobretudo não tive de despedir-me. Não que não goste de conhecer pessoas mas há um desgaste emocional nas apresentações e nas despedidas.

Agora há um trabalho continuado, material e afectivo. Todos conhecem os tempos e os espaços uns dos outros. E tudo corre bem.
Leonoreta

Friday, September 05, 2008

As coisas mudam

Há três anos e pouco que iniciei o blog.
Na altura foi um grande entusiasmo. Escrevia que me fartava. Visitava os outros blogs. Alguns tornaram-se passagem obrigatória até hoje. Procurava imagens. Publicava fotos. Mudava as músicas amiúde.

Tive algumas dores de cabeça por não saber manusear o blogger. Perdia posts. Perdia imagens. Uma vez perdi o blog. Andava desolada.

Com o tempo fui espaçando as minhas publicações. Cada vez mais e mais.
Por falta de tempo. Por falta de assunto. Por falta daquelas pessoas a que já me tinha habituado e acabaram com os seus blogs.

As coisas mudam. Levamos anos a fazer sempre a mesma coisa e de repente as coisas mudam. Ou então não mudam de repente. Mudam devagarinho. Acontece uma coisa agora. E outra daqui a bocado. Acontecimentos sem importância a que até nem damos significado nenhum mas que são um prelúdio para o grande acontecimento, aquele que muda a nossa vida em 180 graus.

E assim de repente, ou devagarinho, fiquei sem tempo para o meu blog, porque desvio a minha motivação para outro acontecimento, acumulação de prelúdios. E, contudo, sem querer perdê-lo de vez, vou à gaveta e nada. Nem um texto da Ana e Leonor, nem um Fragmento, nem um momento da escola.

Apenas o vazio de uma gaveta à espera de mais tempo para ela.

Leonoreta

Friday, August 22, 2008

X - Files

Gosto muito de cinema.
Sempre gostei.
Hoje voltei a ir ao cinema. Já há muito tempo que não ia.

X- FILES.

O confronto da intuição de Mulder com o racionalismo de Scully, dois agentes do FBI, com algumas questões de fé à mistura.

Um guião bem construído com a devida pieguice para suavizar teorias existenciais que poderiam ser demasiado sérias e, como tudo o que é sério, maçudo para esta Pós Modernidade de engolir a papa feita sem discussão.

Saltei algumas vezes da cadeira. Uma parte ou duas não vi. Fechei os olhos. É um processo que utilizo para a tensão arterial não subir ainda mais e dar-me uma coisa má. Desta maneira nunca vi completamente Shinning e Psico.

Gostei do filme, apesar de ter saído de lá a tremer das pernas.
Vi a apresentação de outro filme: Mirrors.
Ahhhhhhhhhhhhhhhhhh!!! QUE MEDO!
Esse nem pensar. Levaria mais tempo com os olhos fechados do que abertos.
Leonoreta

Thursday, July 31, 2008

Na busca de sentido

Desci na bicicleta os cerca de trezentos metros da rampa do Ginjal com os travões a fundo não fosse eu chegar lá em baixo a rolar mais depressa que o velocípede. Como sou agnóstica (quando não se tem a certeza é melhor jogar pelo seguro) rezei para que não passasse nenhum carro que me fizesse encostar à berma da estrada.

É que, para mim, montar numa bicicleta num plano a descer é um caso muito sério. Montar numa bicicleta num plano a subir é um caso impossível. Não passou ninguém e das duas uma: ou a oração funcionou ou então, por serem sete horas da manhã de um sábado de um mês de Agosto toda a gente dormia e estava de férias.

Apanhei o barco para Belém e andei que me fartei por aqueles jardins verdejantes junto ao rio. O terreno a direito deu para fazer algumas habilidades à volta do mapa mundi que enfeita o chão em frente à caravela de pedra.

Uma turista oriental, entretida a conseguir o melhor enquadramento com a sua máquina digital recuava a passos largos em direcção à minha bicicleta e quase tropeçava no pneu da frente se eu não fizesse soar a campainha. Felizmente que percebeu o “trim” universal e eu escusei-me de enumerar uma série de marcas japonesas de telemóveis que conheço, única aquisição de tão estranha língua.
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Certo dia vi num documentário televisivo a lógica morfológica dos símbolos chineses e certo dia depois disse numa aula que escrever chinês era fácil pelo que tive de repente cerca de vinte rostos na minha direcção curiosos por saberem o truque.

- Não, esperem, o que eu queria dizer é que escrever chinês não é assim tão difícil.

Os rostos logo se desviaram do meu com ar de desdém e, se de repente eu era o alvo das atenções, de repente também deixei de o ser. A rectificação frásica fez-me perder em segundos qualquer credibilidade poliglota.
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Apanhei o barco para Cacilhas. Lembrei-me que a rampa a descer era agora a subir. E se às sete da manhã prevalecia a dimensão Metafísica, agora ao meio dia prevalecia a dimensão da Física. Parei junto ao elevador panorâmico. Hesitei. Como sou agnóstica (nunca se sabe) rezei para que o segurança me deixasse subir com a bicicleta.

- O senhor deixa-me subir no elevador com a bicicleta?
- Suba lá. – disse ele, sem retirar as mãos cruzadas atrás das costas.

Entre aquilo que é, e sei que é, e aquilo que poderá ser, e não sei se é, partindo da minha experiência, vou explicando a minha realidade, ultrapassando-a de modo a chegar a outras realidades que a transcendem numa busca de sentido.

Leonoreta

Thursday, July 17, 2008

A pé pela estrada preta

Na sequência do post anterior venho dar conta dos resultados obtidos com o “se bem pensei… melhor seria não o ter feito”.

Ah pois!

Experimentar a mota de duzentos kilos esteve sempre fora de questão. Conheço as minhas limitações.
Mas a Scootter… porque não?!

Duas rodas movidas a força motorizada não são duas rodas movidas a força “pernil”. Quero dizer que uma mota por mais pequena que seja não é bem uma bicicleta.
Os movimentos são todos diferentes.
Além disso, se há motor, há pedais. Se não há pedais, há alavancas.
Num automóvel, por exemplo: vejam bem o que temos de fazer ao mesmo tempo. Um pé para a embraiagem e outro para o acelerador e para o travão. A mão esquerda segura no volante, a direita coloca as mudanças e ainda por cima, temos de estar com “um olho no burro e outro no cigano”, olhando em frente, para os lados e para trás.

Até parece que sou má condutora de automóveis mas na verdade não sou. E já que até conduzo bem um automóvel e a bicicleta, porque não experimentar uma motinha?

Aquilo é complicado. Uma mão para acelerar, outra para travar. Dá-se um cheirinho no acelerador e o veiculo até voa. Voar numa motoreta não é bem o meu objectivo. Se eu quisesse voar pedia emprestado ao Aladin o seu tapete.

Aquilo não parava. Nem me lembrei que era a mão esquerda que travava, em parceria com a mão direita que deixava de acelerar.
Quis sair da mota. Não sei se me atirei para o lado por iniciativa própria. Não me lembro.

Levantei-me completamente arranhada.
Um sonho por água abaixo. Se é que os sonhos se afogam.
Leonoreta já não vai pela estrada preta. Vai para a fonte a pé, nada formosa e muito insegura.
Leonoreta

Friday, July 04, 2008

Aprender até morrer

Ultimamente aconteceu algo novo na minha vida.
Comecei a andar de mota. Como pendura.
Aprendi que há roupa própria e um montão de capacetes.

Experimentei uma série de blusões. Estavam todos apertados. Afinal são assim mesmo. Por causa do vento.
- Se o casaco estiver largo enfola com o vento e voamos como os balões. – explicaram-me.
- Ah! O vento, esse tresloucado.

Mesmo assim, experimentei uma série de blusões à procura do ideal. Acabei por achá-lo. Um de couro muito bonito que me dá uns ombros de robot cop. Hoje sei que não fui eu que achei o casaco mas que foi o casaco que me achou a mim. Quando a dona da loja me viu entrar percebeu que eu tinha caído do céu para um casaco que tinha para vender há séculos e que não servia a ninguém.

E agora que sei subir e descer, que sei segurar-me e equilibrar-me, a tirar o capacete e a manter-me penteada, quero mais.
Quero passar do lugar de trás para o da frente.
Arrisco-me a ganhar velocidade para a eternidade.
Eu sei.
Leonoreta

Friday, June 13, 2008

Agora ficas tu

Quando eu me demoro a chegar à sala depois do intervalo há sempre alguém a vigiar a porta, uns metros mais à frente, para que os outros escrevam tudo o que quiserem no quadro e a professora não ver.

Depois, quando o vigia me vê a aproximar corre para que os colegas tenham tempo de apagar o quadro.

E desta vez a escolha recaiu no Nichita. Nichita já fala bem. Já diz “eu percebo”. Já diz “posso distribuir?” (os trabalhos feitos ao longo da semana que precisam de ser arrumados no dossier). Já diz “posso ir eu?” (quando eu peço um voluntário para ir ao quadro.

Mas Nichita distrai-se e quando me vê quase em cima dele tem um susto que não consegue disfarçar. Corre à minha frente a gritar “PROFESSORA, PROFESSORA”.

Não escrever no quadro na minha ausência é uma regra de sala de aula a fim de evitar conflitos pela posse do giz e do espaço da ardósia.
Antes de eu entrar na sala, entro na casa de banho e conto até trinta. Quando entro na sala, o quadro está limpo, está tudo sentado em silêncio.

Olho para o quadro. Olho para eles.

- Será que apaguei o quadro antes do intervalo? – pergunto “espantada” porque fica sempre matéria escrita.

Ninguém responde. Entreolham-se comprometidos à espera do que virá depois.

- Bom! Se calhar apaguei. Filipe começa a ler o texto.

E todos abrem o livro aliviados de uma possível punição.

No contexto de sala de aula não há receitas para controlar comportamentos indisciplinados mas uma coisa o tempo me ensinou: o castigo só os agrava.
Leonoreta

Friday, May 23, 2008

O Estrangeiro

Nichita ingressou na turma há um mês.
Três dias antes chegou um fax à escola a informar que eu iria receber um menino moldavo.
Estamos no 3º período mas isso não interessa. Escola começa em qualquer dia.. Stephany é brasileira. Chegou no meio do 2º período e ela lá vai contente, apanhando os outros.

Falei com a turma. Vinha aí um colega novo. Estrangeiro. Tínhamos de ter todos muita amizade para dar e muitas palavras para ensinar.

De repente percebi que eu não sabia onde ficava a Moldávia. O Google mostrou-me onde era. A língua é o Romeno, uma das línguas latinas.
Como ensinar-lhe português? Como ensino inglês a um português. Mas quando o português não entende a língua estrangeira recorro à língua materna.
Quis um dicionário de romeno. Mais uma vez descobri-o na Internet. Com som e tudo.

Três dias depois o Nichita entra na sala acompanhado dos pais. O pai arranha português. A mãe fala comigo em francês, inglês e italiano. A minha veia portuguesa permite entender qualquer cidadão do mundo.

Começamos pelo i. Rapidamente avanço para o u. Descubro que ele percebe o ditongo: iu. Junto o p e ele lê piu.
Paro.
Escrevo pa, pe, pi, po, pu. Ele lê.
Junto pa com to. Ele lê.
Ai que maravilha! Ele sabe ler. Mas… não atribui significados ao que lê.
Nunca desenhei tanto na minha vida para ensinar conceitos como dentro, fora, sobe, desce…Por vezes ele encolhe os ombros. Não percebe. Contudo, nunca desistimos.

Sentei-o na carteira da frente perto de mim, ao lado da Stephany. Ela, nas suas dificuldades, ajuda-o.
Desenhei-lhe um rectângulo no caderno. Escrevi por baixo o nome dele e disse: desenha o Nichita. Ele hesita. Stephany diz-lhe, carinhosamente o seu indicador no peito do colega: É você. Desenha você.

Um dia, num dos meus intervalos passados na sala chego-me à janela para observar os miúdos que jogavam à bola. Alguns vêem-me e saúdam-me.
Nichita que brinca com eles diz-me adeus e ri-se. Está contente na escola.


Leonoreta

Friday, May 09, 2008

O nosso galo

No 1º ano, ao mesmo tempo que dou uma letra nova, procuro no meu património cultural adquirido na escola primária o meu reportório musical a fim de arranjar uma canção que possa alegrar a aprendizagem dessa letra.

Não sei porquê mas os miúdos adoram a canção do galo. Pela cadência musical?

- Ok, vamos lá saber o que estas palavras querem dizer. – digo eu.

O nosso galo é bom cantor
É bom cantor
Tem boa voz

(O nosso galo é bom cantor porque tem boa voz.)

Mas veio um dia e não cantou
Outro e mais outro e não cantou

(o que é que aconteceu?

- Perdeu a voz. – diz um.
- Não quis mais cantar. – diz outro

O mais malandro, o David, sentado lá atrás passa o indicador esticado pela ao longo do pescoço em jeito de faca.

- Pois é. – digo eu - O dono matou-o e comeu-o. Esta canção é uma canção que fala de morte.
- iiiii, professora, morte não. – diz a Filipa, que anda no psicólogo desde os três anos de idade porque encontrou o avô morto no chão da sala.
- Filipa, eu também não gosto mas a morte faz parte da vida. As plantas, os animais nascem, vivem e morrem.

A Filipa conta o trágico acontecimento que a traumatizou. Momento difícil para uma miúda de seis anos que relembra aquele dia como se fosse ontem.
Cantamos a canção em vários andamentos. Mais depressa na primeira parte e em passadas lentas na segunda como se fossemos num funeral. Alguns só fazem de galo. Cantamos várias vezes.

Não creio ter banalizado a tristeza ou a dor de perder alguém mas apenas falar e pensar nela porque ela existe.


Leonoreta

Friday, May 02, 2008

Não me importo

Éme
(http://aoutravez.blogspot.com/)

e Theo
(http://asebenta.blogspot.com/

“desafiaram-me para um desafio” cujo tema é: Com o que é que não te importas?

Regras do jogo:
- Mencionar seis “não me importo”
- Passar o desafio a dez blogs.

Ora bem!

Não me importo mesmo nada de participar nos desafios e até os acho divertidos e assim à primeira, sem pensar, sou capaz de começar logo a disparatar a dizer que não me importo de ir ao cinema todos os dias.

Pensando melhor, a pergunta não é fácil, especialmente por me limitar a um número de respostas. Porque há muitas coisas com as quais não me importo. Mas as mais importantes quais são?

Concluí que:

- Não me importo que os meus filhos sejam felizes.
- Não me importo que as árvores percam as folhas no Outono se elas me disserem que estarão floridas na Primavera seguinte.
- Não me importo de ajudar qualquer pessoa naquilo que eu souber e naquilo que eu não souber procurar o conhecimento com ela.
- Não me importo que a visão do arco-iris me aqueça a alma depois de uma tempestade me ter encharcado o corpo.
- Não me importo que os meus alunos me tratem por tu e me procurem sempre que precisarem de mim.
- Não me importo de ver Fernão Capelo Gaivota e ouvir Morning has broken vezes sem conta.

Na dificuldade em escolher blogs preferidos passo a palavra a todos aqueles que me visitarem.

leonoreta

Friday, April 25, 2008

O marasmo da felicidade

O que eu vou dizer não tem nenhum fundamento científico. Parte da minha especulação e é por isso puro senso comum. E a minha representação de problema alcançada da minha experiência.
Entendo por problema uma situação que me obriga a uma escolha. Há situações que não me oferecem dúvidas mas outras há que me deixam vacilante por desconhecer até que ponto a alternativa é melhor.
Por exemplo, olho para a montra de uma loja num centro comercial e gosto da blusa que está no manequim que é dois números abaixo do meu.
Surge o problema: será que há uma blusa para o meu tamanho?
A menina diz que sim. Óptimo. Problema resolvido. A menina traz-me uma blusa verde e outra vermelha. Novo problema. São as duas engraçadas mas só posso levar uma. Opto pela verde sempre a pensar na vermelha. A mesma obsessão teria se escolhesse a vermelha.

Olho para o relógio. É cedo e não me apetece ir para casa. Ainda tenho tempo para ver um filme e passo pelo cinema.
Novo problema: dois filmes me agradam mas não sou ubíqua. Que maçada! A ubiquidade é que me dava jeito para algumas coisas.
Bom! Lá me decido pela comédia romântica. Problema resolvido. Quando me sento, atrás de mim comem pipocas. O som ensurdecedor abafa o diálogo do filme. Que alternativa?

Vivemos a vida toda com problemas para resolver. Temos sempre um problema entre mãos. Isto é, quando resolvemos um problema, logo a seguir temos outro para testar a nossa paciência.
Por isso aconselho: deixem-se estar com o vosso primeiro problema. Deste modo, o segundo não aparece.
Afinal, quem é que nos garante que o problema que vem a seguir é mais suave? É provável que nem haja problemas suaves e problemas difíceis. O que os torna mais isto ou menos aquilo é a nossa disposição física e mental no momento para lidar com o assunto.
Os problemas são precisos, dirão alguns de vós, servem para dar cor à vida.
Claro que sim. É que se não tivéssemos problemas para resolver viveríamos num perfeito marasmo da felicidade.
Leonoreta

Friday, April 18, 2008

E bom tomar café

Numa das muitas vezes em que o corpo docente toma café na sala dos professores, meti-me na conversa de duas colegas minhas como é defeito do meu à vontade.

Falava-se de história de Portugal.
- Inês de Castro é a minha personagem histórica preferida. A história dela é a parte mais bonita da nossa história – disse uma colega.
Arrematei à queima - roupa.
- Mas isso foi tudo inventado por Camões. De facto o amor de Dom Pedro e Dona Inês não foi assim tão romântico.

Vi o espanto no seu estado puro nos olhos da minha colega.
- Não acredito! – disse ela, esperançada que eu dissesse que eu estava a mentir.
- É verdade! Camões estudou em Coimbra. Namorou muito na Fonte das Lágrimas. Tinha imaginação, sabedoria, e deu um toque de ficção à história. Penso que foi muito bem conseguido. Depois o povo adoptou o romance dos dois como verdade e passou-o à realidade mas todo aquele enredo não passa de uma lenda.

- Não acredito! – continuava ela, ouvindo-me desconfiada.

- É verdade. Nas Lendas e Narrativas de Alexandre Herculano, um grande historiador, muito honesto...tão honesto que foi excomungado pela Igreja por dizer que João das Regras falseou a subida ao trono de João I na crise da sucessão de 1385, Dom João que era um dos bastardos nascido de uma outra relação de Dom Pedro com outra mulher ao mesmo tempo que namorava Dona Inês… não se encontra nada relativo à veracidade dos factos dos dois amantes. – eu falava depressa, olhando-a na sua incredulidade, divertindo-me a provocar o fanico.
Provoquei uma ruptura de conhecimento. É bom tomar café com as colegas.

Leonoreta