Ex Improviso

Mínimo sou, mas quando ao Nada empresto a minha elementar realidade, o Nada é só o Resto. Reinaldo Ferreira

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Dizem que sou como o sol mas com nuvens como na Cornualha

Thursday, March 31, 2005

Cartas de Amor


Desenho feito por um dos meus alunos.
Desta vez não o trabalhei no paint para lhe dar mais cor.
Decidi respeitar o original




Na escola primária, a partir do 2º ano, já circulam pelos alunos os bilhetinhos de amor. Quando vejo algum a atravessar a sala de lés a lés, passando de mão em mão – os cúmplices – tento apanhá-lo, muito sorrateiramente.

Há-os lindos, desde os mais perifrásticos até aos de pergunta americana com um quadradinho à frente para colocar uma cruz a dizer sim ou não à inevitável pergunta: queres namorar comigo?

Levo o bilhete para a sala de professores. mostro-o a todas as colegas. Rimos, gracejamos numa festa ruidosa e alegre, aprovando satisfeitas: os afectos funcionam.

Apago os nomes do bilhete para não comprometer ninguém. Fotocopio-o e entrego-o a todos os alunos da sala. Riem. À excepção do remetente e do destinatário que reconhecem o manuscrito mas que depressa percebem a minha discrição selada num segredo.

Lemos o texto. Corrigimos a ortografia. E já agora vemos qual a melhor pontuação a ser usada a fim de despoletar melhor as emoções. Decoramos a folha com cupidos de sorriso matreiro armados de arco e flecha e corações trespassados por setas a pingar gotas de sangue vermelho vivo de amores sofridos.

Trabalho a língua portuguesa e a expressão plástica a partir de experiências vivenciais dos alunos. Fico com a sensação de ter cumprido o meu dever.

Estimulo a expressão de sentimentos que não devem ficar envergonhados em futuros adultos. Fico com a sensação de ter cumprido o meu prazer.

Confesso a minha maldade.





Todas as Cartas de Amor são Ridículas


Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)


de Álvaro de Campos

Tuesday, March 29, 2005

A Voz da Floresta

(A criatividade da Danuta Wojciechowska)

A natureza era a companhia do homem primitivo. Ela fornecia abrigo e alimento e, em retorno, a humanidade a reverenciava. As religiões primitivas louvavam as pedras e montanhas, os campos e florestas, os rios e oceanos.

A Voz da Floresta é uma ponte mítica entre o mundo dos deuses e o dos homens, entrelaçado com a veneração que os Celtas tinham pelas árvores. Como uma representação do universo, as raízes das árvores habitam o solo, o conhecimento profundo da Terra. E o tronco une as raízes ao céu, trazendo este conhecimento à luz.


Plantar uma Floresta

Quem planta uma floresta
Planta uma festa

Planta a música e os ninhos,
Faz saltar os coelhinhos.
Planta o verde vertical,
Verte o verde,
Vário verde vegetal.

Planta o perfume
Das seivas e flores,
Solta borboletas de todas as cores.

Planta abelhas, planta pinhões
E os piqueniques das excursões.

Planta a cama mais a mesa.
Planta o calor da lareira acesa.
Planta a folha de papel,
A girafa do carrossel.

Planta barcos para navegar,
E a floresta flutua no mar.
Planta carroças para rodar,
Muito a floresta vai transportar.
Planta bancos da avenida.,
Descansa a floresta de tanta corrida.

Planta um pião
Na mão de uma criança:
A floresta ri, rodopia e avança.


de Luísa Ducla Soares in A Gata Tareca e Outros Poemas levados da Breca


Para saberem qual a árvore
que se coaduna convosco de acordo
com o dia do vosso aniversário.
Carreguem AQUI

Monday, March 28, 2005

Na Noruega



Tenho amigos atentos ao funcionamento do meu blog. Vão mandando fotografias e temas para reflectir. E por isso lhes sou muito grata.
O documento que se segue, não sendo da minha autoria, publico-o na íntegra:


"Na Noruega, o horário de trabalho começa cedo (às 8 horas) e acaba cedo (às 15.30). As mães e os pais noruegueses têm uma parte significativa dos seus dias para serem pais, para proporcionar aos filhos algo mais do que um serão de televisão ou videojogos. Têm um ano de licença de maternidade e nunca ouviram falar de despedimentos por gravidez."

"A riqueza que produzem nos seus trabalhos garante-lhes o maior nível salarial da Europa. Que é também, desculpem-me os menos sensíveis ao argumento, o mais igualitário. Todos descontam um IRS limpo e transparente que não é depois desbaratado em rotundas e estatuária kitsh, nem em auto-estradas (só têm 200 quilómetros dessas «alavancas de progresso»), nem em Expos e Euros."

"É tempo de os empresários portugueses constatarem que, na Noruega, a fuga ao fisco não é uma «vantagem competitiva». Ali, o cruzamento de dados «devassa» as contas bancárias, as apólices de seguros, as propriedades móveis e imóveis e as «ofertas» de património a familiares que, em Portugal, país de gentes inventivas, garantem anonimato aos crimes e «confundem» os poucos olhos que se dedicam ao combate à fraude económica."

"Mais do que os costumeiros «bons negócios», deviam os empresários portugueses pôr os olhos naquilo que a Noruega tem para nos ensinar. E, já agora, os políticos.
Numa crónica inspirada, o correspondente da TSF naquele país, afiança que os ministros não se medem pelas gravatas, nem pela alta cilindrada das suas frotas. Pelo contrário, andam de metro, e não se ofendem quando os tratam por tu. Aqui, cada ministério faz uso de dezenas de carros topo de gama, com vidros fumados para não dar lastro às ideias de transparência dos cidadãos. Os ministros portugueses fazem-se preceder de batedores motorizados, poluem o ambiente, dão maus exemplos e gastam a rodos o dinheiro que escasseia para assuntos verdadeiramente importantes."

"Mais: os noruegueses sabem que não se «projecta o nome do país» com despesismos faraónicos, basta ser-se sensato e fazer da gestão das contas públicas um exercício de ética e responsabilidade. Arafat e Rabin assinaram um tratado de paz em Oslo. E, que se saiba, não foi preciso desbaratarem milhões de contos para que o nome da capital norueguesa corresse mundo por uma boa causa."

"Até os clubes de futebol noruegueses, que pedem meças aos seus congéneres lusos em competições internacionais, nunca precisaram de pagar aos seus jogadores 400 salários mínimos por mês para que estes joguem à bola.
Nas gélidas terras dos vikings conheci empresários portugueses que ali montaram negócios florescentes. Um deles, isolado numa ilha acima do círculo polar Árctico, deixava elogios rasgados à «social-democracia nórdica». Ao tempo para viver e à segurança social."

"Ali, naquele país, também há patos-bravos. Mas para os vermos precisamos de apontar binóculos para o céu. Não andam de jipe e óculos escuros. Não clamam por messias nem por prebendas. Não se queixam do «excessivo peso do Estado», para depois exigirem isenções e subsídios."


Aproveito o comentário de quem me enviou este depoimento:
"É tempo de aprendermos que os bárbaros somos nós. Seria meio caminho andado para nos civilizarmos."


Para agora eu fazer o meu:

Citando Júlio César, aquele imperador romano que se viu grego para conquistar a Ibéria, mais propriamente o povo Lusitano chefiado por Viriato, “Que povo é aquele que não se governa nem se deixa governar?”


Leonor

Saturday, March 26, 2005

Pegadas na areia


Os amigos que visitam o Ex Improviso já devem ter notado que não sou uma pessoa de ideias fixas.

Isto é…

Apesar de eu saber mais ou menos bem o que quero e acredito, gosto de deixar uma margem para outras maneiras de pensar.

Por isso, digo mais ou menos bem devido ao processo de aprendizagem diária a que estamos sujeitos ao longo de toda a nossa vida que nos aperfeiçoa as ideias, supostamente, quando as temos.

Assim sendo, professando outros rigores cuja validade se admite com demonstração admiro outros entendimentos.
Vou então contar a seguinte parábola, de origem bíblica, que eu sempre achei admirável pelo sentido de protecção sobrenatural que encerra.


“À medida que um homem caminhava pela praia as suas pegadas iam sendo sulcadas na areia. Ao lado das suas pegadas via-se mais um par de pegadas.
- Tenho reparado que caminhas sempre ao meu lado quando as coisas me correm bem, pelas tuas pegadas sempre ao lado das minhas. Mas quando as coisas me correm mal, só vejo um par de pegadas na areia. Porque me abandonas quando estou infeliz? – perguntou o homem ao seu companheiro invisível.
- Quando estás infeliz, eu carrego-te ao colo. – respondeu o Senhor.”


Leonor

Friday, March 25, 2005

O Martírio de Cristo

A arte da
Betty Branco Martins
em
O mar de Tinta

Wednesday, March 23, 2005

Reencarnação


Reencarnação.

Do latim, Incarnare, que significa tornar carne. Mais o prefixo re. Que significa de novo.

Entende-se por reencarnação a suposta transmigração da alma humana, após a morte do corpo, para outro corpo, tanto de homem como de animal.

Pitágoras, filósofo nascido VI a.C., natural de Samos, na Ásia Menor, precursor da referida teoria, recusava-se a comer animais, não fosse ele estar a alimentar-se da sua avó.

Seja como for, a acreditar nesta conjectura, as mentes mais curiosas perguntam, quem vem a este mundo fazer o quê?

Há quem diga, que estamos nesta dimensão para experenciar determinadas sensações que noutra dimensão não é possível. E a aquela ideia de Déjà Vú advém, precisamente, de alguns espíritos se cruzarem nos mesmos “workshops” uma vida, outra vida e ainda mais outra, isto é, antes de aparecermos por cá, escolhemos por lá, a emoção que queremos viver.

São as teorias da nossa existência…
concepções do espírito mais ou menos largas e mais ou menos sistematizadas, voluntariamente poéticas e quase religiosas, para explicar o real de maneira satisfatória, mesmo que as suas representações possam ser falsas.


Leonor

Monday, March 21, 2005

Viva a Primavera, as Árvores e a Poesia

(O Surrealismo de Salvador Dali)


Hoje começa a Primavera.

Apareceu de cinzento, mas ficava-lhe bem.

Os cabelos húmidos a esvoaçarem ao vento,

davam-lhe um ar docemente adolescente.

Cantou o hino da floresta às arvores

e juntas, dançaram descalças na terra molhada.



Leonor


No cumprimento do dever



Hoje todas as manchetes dos jornais foram unânimes na apresentação da notícia: Polícias mortos na Amadora.Como uma homenagem feita pela Imprensa em nome do país inteiro. E todos assinámos em baixo.

E unânimes foram também as suas opiniões, independentemente da cor política que representavam: esta violência não pode continuar.

A notícia choca pela idade dos agentes da PSP. 23 e 30 anos. Estes dois jovens, saíram de casa para cumprir o seu dever como cidadãos (prestar um serviço à sociedade, em troca de um salário) e são mortos por um individuo que vive fora da lei, à margem da sociedade, que não trabalha, não desconta nem para o IRS, nem para a Caixa de Previdência, e provavelmente, ainda recebe subsídios do nosso governo para poder comprar as balas a fim de matar os jovens polícias.

Fala-se em reforçar a acção da polícia em bairros de comportamentos desviantes às normas sociais, onde o crime organizado pulula… A optar por este modo de proceder será mais tempo perdido e mais vítimas serão feitas, ou seja… continuará O Triunfo dos Porcos.

Mude-se a atitude das “Inteligentia” em relação aos direitos de quem cumpre com o conceito de cidadão, reveja-se as alíneas de determinados artigos que em vez de proteger quem lida com grupos de risco, põe em causa a sua integridade física e psicológica (não se esqueçam dos professores) e aos deveres de quem não cumpre, e de repente, tenho a certeza e vocês também, que teremos uma sociedade melhor.


Leonor

Saturday, March 19, 2005

Gepeto: O pai que queria um filho


Creio que a história de Pinóquio criada por Carlo Collodi no século XIX, é a que melhor retrata, na Literatura Infantil, o amor que um pai pode ter a um filho.
Gepeto, o velho marceneiro que vive sozinho, constrói um boneco de madeira a partir de um tronco de carvalho porque deseja muito ter um filho para sua companhia e chama-lhe Pinóquio.
Como todos os filhos, Pinóquio, sai de casa, cumprindo o ritual de crescimento e conhecimento do mundo. E, como todos os filhos, não dá muita importância aos conselhos do pai.
Após algumas aventuras tristes, sofrendo a rejeição e o desengano, Pinóquio reconhece nos ensinamentos de Gepeto o verdadeiro amor de pai que perdoa qualquer coisa no filho, porque é filho.
E nós que somos pais, reconhecemos no bem querer do nosso pai o bem querer que temos pelos nossos filhos.



Poema para o Pai


Hoje é o teu dia pai!
O mundo criou-o para eu te lembrar uma vez por ano.
Depois pai... são outros dias.

Mas eu não quero saber de ti só por um dia, pai
eu lembrar-te-ei todos os dias
porque um dia
ensinaste-me a andar de bicicleta
transportaste-me às cavalitas quando parti o pé
correste atrás do miúdo que me bateu
levaste-me ao cinema ver a Branca de Neve
disseste ao fantasma que vivia debaixo da minha cama para me deixar em paz
não gritaste comigo quando perdi o ano na escola
respeitaste a minha ideia e a minha vontade quando me fiz gente

por isso, para mim, pai, lembrar-te-ei todos os dias.



Leonor

Wednesday, March 16, 2005

Direitos de Existir



Hoje vinha aqui falar de outra coisa. Mas o problema da matança de focas bebés deixou-me a pensar na natureza do homem. E no sofrimento das focas, claro.

Não vou dizer nada de novo, que ninguém saiba até agora. Venho só mostrar a minha indignação por este tipo de situação ainda ser possível numa altura em que a consciência pela preservação de todas as espécies do planeta é sobejamente conhecida e se torna obrigatória a fim de manter o seu equilíbrio. E o nosso, também.

O homem é uma coisa espantosa: apetrechado de todas as capacidades para fazer o bem, opta, na maioria das vezes, por fazer o mal, pelo dinheiro. Rousseau, hoje, teria de rever a sua teoria do Bom Selvagem. Mas depois, lá vinha Joseph Conrad a dizer que se o homem é assim é devido à influência nefasta da sociedade... e há anos que não saímos disto. Enquanto defendemos uma e outra posição, vão-se cometendo atrocidades contra tudo e todos.
As focas são mortas à paulada para a sua pele ser aproveitada por inteiro para a confecção de vestuário luxuoso. Apanhados pelas autoridades, os assassinos disseram que a população das focas precisava de ser reduzida porque dizimavam a população de peixe. Ouvir mais uma vez a notícia deixou-me agoniada, a morrer de pena dos bichinhos… porém a desculpa dada pelos assassinos despoletou em mim a vontade de pegar no pau e aproveitar-lhes a pele para …. tambores.
Lembro-me dos compêndios de psicologia: comportamento gera comportamento.
Lembro-me da máxima do Velho Testamento: Olho por olho, dente por dente.
Desculpas para colmatar a minha natureza de fazer o mal, por um ideal.

Leonor

Sunday, March 13, 2005

Arte Moderna



A arte, a obra de arte, a arte antiga e a arte moderna.

Penso que a arte é sempre moderna por representar sempre o seu tempo. O problema da Arte Moderna é que passa rapidamente de moda, transpondo o conceito àquilo que já era, ou seja à Arte Antiga. Para os artistas modernos, o ser moderno é mostrar de modo diferente, o que outros já fizeram antes deles, também de forma muito particular, subjectiva.

Ora bem!
Quando falamos de Arte Moderna, falamos, obrigatoriamente, de subjectividade, daquilo que é aparente, ilusório, que é próprio do sujeito ou relativo a ele… e só a ele, acreditem. E quantas e quantas vezes a expressão dessa subjectividade provoca quase sempre um bloqueio mental nas pessoas incapazes de apreciar tal coisa, independentemente da sua classe social, pelo que podemos afirmar, terminantemente, que os bloqueios mentais são democráticos, o que já não é mau.

Falo da minha experiência como apreciadora de arte. Confesso os meus bloqueios. Mas, seja como for, apesar da Arte Moderna perturbar o sentido das minhas conveniências (a arte não é útil… pretende-se agradável) nunca a rotulo de boa ou má… arte…e tento – palavra de honra – entender os sentimentos de tensão e de crise que levaram o artista a tal manifestação artística.

Leonor

Friday, March 11, 2005

Recuando



Ouvi há dias na rádio a notícia de que a Nestlé ia deixar de comercializar os célebres smarties, rodinhas coloridas com recheio de chocolate guardadas num delicioso tubinho de cartão cuja tampa tem uma letra do nosso alfabeto.
Ou seja, os smarties além de lúdicos por nos encherem o id de coisas doces, também são didácticos por nos incentivarem a formar palavras com as letras.

Fiquei sem saber como seria a nova embalagem mas, provavelmente, será um daqueles saquinhos de cor castanha sem piada alguma, decorados com bonecos de olhos esbugalhados a despejarem os smarties pela boca escancarada.

Acabando o tubinho acaba também uma parte da minha infância. Quer dizer... fico aborrecida.

Primeiro, vi desaparecer os “mosquitos” que me fizeram delirar com as aventuras do Mandrake, do Fantasma, do Cisco Kid, do Búfalo Bill;
Depois foi o gelado da Olá e da Rajá que oferecia bonequinhos e cujo pau, às vezes, dizia prémio. (tive a sorte de ser sorteada algumas vezes e sempre que isso acontecia era como se ganhasse a lotaria);
Os cubinhos de marmelada embrulhados em papel transparente;
As pastilhas elásticas em forma de moeda com papel dourado;
Os lápis de carvão com um guizo na ponta;
As esferográficas Bic Cristal e Bic Laranja;
O Muppet Show, Grease, Hair…

Está bem, está bem… vou acabar aqui.
Leonor

Wednesday, March 09, 2005

O Maravilhoso nos Contos de Fadas


Os contos de fadas existem na cabeça dos homens desde sempre. Primeiro de expressão oral e, posteriormente, de expressão escrita, eles são necessários para apaziguarem a insatisfação do ser humano perante uma existência medíocre de afectos.

Quando os leio aos meus alunos na Hora do Conto, exagero no Maravilhoso para que desenvolvam o gosto pela fantasia que um dia lhes dará asas para colorir dias cinzentos.

A Bela e o Monstro é o meu conto de fadas preferido. Nesta historieta o príncipe vive num castelo encantado vítima de um sortilégio que o transformou num monstro horrível e só o amor de uma jovem pode quebrar o feitiço.

Por um acaso do destino, a Bela, criatura linda de virtudes, é forçada a um convívio diário com o Monstro, tolerando o seu mau feitio da melhor maneira que sabe e que pode. Inexplicavelmente, a simpatia e a dedicação entre os dois nasce de modo ténue e vai crescendo à medida que passamos as páginas.

A Bela é libertada do seu cativeiro e volta à sua vida, deixando-nos numa angústia solidária com o Monstro. Mas, por um acaso do destino, e ouvindo os nossos gritos deste lado do Era uma vez (Volta, Bela, volta) a Bela retorna ao palácio.

Silêncio. Olhos e bocas abertas. Tempo para voltar do lado de lá.

- “Que bonito, professora. Conte outra vez.”

A Hora do Conto acabou. Temos de trabalhar as adições com transporte. Eles olham para mim. Aguardam. Eu olho para eles. Hesito.

Oh! Quero lá saber. E leio a história outra vez.
Leonor

Tuesday, March 08, 2005

Dia da Mulher



Para lembrar o Dia da Mulher,
o pensamento simples e conciso de Helen Reddy
e a pintura expressiva de Toulouse Lautrec.

Sunday, March 06, 2005

Balada da Neve



Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.
É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...
Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.
Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria...
Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!
Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho...
Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança...
E descalcinhos, doridos...
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!...
Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!...
E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
e cai no meu coração.

de Augusto Gil

Saturday, March 05, 2005

Problemas de Comunicação


O presidente da câmara de uma cidade discursava para a população:
Somos os maiores produtores de trigo da região;
Somos os maiores produtores de milho da região;
Somos a maior vara de porcos da região...
Pois...

Thursday, March 03, 2005

Tremores de Terra


Vai haver no próximo sábado, dia 5 de Março, uma simulação de um sismo no parque da Bela Vista, em Lisboa, lá no sítio onde se fazem os concertos musicais do Rock In Rio, a fim de ensinar à população em idade escolar como agir em tais casos.

Nada melhor que experimentar na pele o fenómeno, ainda que suposto, e ainda bem que fingido, para ter a noção da utilidade do concreto em detrimento da só teoria.

Mas amanhã, se Deus quiser, não será a véspera desse dia, como diziam os gauleses de Uderzo e Gosciny.

A dona Eulália, auxiliar de muitos anos da escola entrou na sala, avisando do evento.
Logo à partida a turma mostrou-se desinteressada. Não que tivesse alguma coisa de importante para fazer nesse dia mas… sei lá… não vou… não quero.

Os anos de serviço da dona Eulália naquela escola de Chelas fê-la reforçar o aviso (parece que é muito importante angariar participantes para o evento porque senão não valerá a pena fazer tremer o solo só para um gato pingado).

- Vai ser distribuído um lanche. – disse a senhora.

E logo de imediato, a vontade daqueles miúdos, essa firmeza na decisão e constância na execução, girou cento e oitenta graus.

Onde é que é isso? A que horas? Quando? - as vozes atropelavam-se.

E, perante aquele episódio, ali estava eu, na border line, entre a razão e o que a ela é contrário, a tentar perceber certas facetas do meu mundo.
Leonor

Wednesday, March 02, 2005

A Interactividade envolve-nos a todos



Se, por um lado, o aparecimento da televisão mudou o mundo, materializando o conceito de aldeia global, por outro, o célebre caixote falante reinou silencioso durante anos com limitações evidentes: não oferecia possibilidade de resposta a quem o ouvia.
(Só eu sei quantas vezes avisei o herói do filme para fugir do bandido e ele nunca me ligou, deixando-se sempre apanhar).

Mas a chegada do computador pessoal permitiu uma interactividade que terminou com o sentido de passividade, envolvendo-nos a todos.Nele é possível a comunicação nos dois sentidos, isto é, a partilha de mensagens entre emissor e receptor, dando uma ideia de liberdade: navegamos pela informação que nós queremos, fazemos negócios, criamos blogs, formamos comunidades com interesses afins… tudo num abrir e fechar de olhos.

Livre da dimensão física do mundo real o homem alcança uma nova dimensão onde tudo pode ser possível. Ultrapassa o obstáculo da falta de tempo no seu quotidiano, percorrendo espaços longos, contactando o seu semelhante nas mais variadas partes do planeta.Os gestos, os olhares, os sorrisos, as pausas que a comunicação verbal e não verbal nos oferece no contacto real são possíveis agora na "semântica do monitor e do teclado".

Leonor



Fábrica

Máquina vai, máquina vem
Máquina grita, máquina fala:
Ninguém, ninguém, ninguém,
ninguém sabe escutá-la.
Máquina chora, máquina ri
Máquina vai, máquina volta
Ouvi-a! Ouvi-a!
Ouvi, ouvi sua revolta.
Máquina vai, volta outra vez:
Sim – não? Não-sim? Não-sim? Sim- não?
Homem responde!
Diz-lhe quem és
Vês como sofre sozinha, vês?
Homem, empresta-lhe o coração!
Manuel Trigueiros