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Mínimo sou, mas quando ao Nada empresto a minha elementar realidade, o Nada é só o Resto. Reinaldo Ferreira

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Dizem que sou como o sol mas com nuvens como na Cornualha

Thursday, July 19, 2007

Se um dia por acaso

Há cerca de trinta anos que existe um alfarrabista perto da minha casa. E assim como gosto de visitar livrarias e ver se há algum título que me chame a atenção mais gosto ainda de entrar nos alfarrabistas e ver se descubro obras que já deveria ter lido e ainda não li.

Abro um parêntesis. Tive um professor de filosofia que um dia me dizia a meio da aula “Mais tarde ou mais cedo, todos nós temos de ler As Confissões de Santo Agostinho” e eu pensei “Todos nós?”.

Fiquei com a ideia de que As Confissões era um livro a procurar urgentemente antes que me acontecesse alguma e eu fosse para o outro mundo sem ler tal preciosidade.

Mas voltando à conversa do alfarrabista que existe perto da minha casa há cerca de trinta anos…

A particularidade deste alfarrabista é que ao longo das três décadas da sua existência deve ter aberto as portas ao público apenas uma, em dias alternados, e nunca mais de dois seguidos. De modo que, apanhar a loja aberta é uma espécie de sorte grande pelo que o melhor será sempre andar com dinheiro no bolso.

Os livros estão sempre no mesmo sítio e já se encontram com as capas debotadas pelo sol. Sei exactamente o lugar que ocupam de tanto observar a montra e quais comprar quando apanhar a porta aberta. Se a apanhar.

Um desses livros é O retrato de Dorian Gray de Óscar Wilde. Gosto deste autor pelas verdades dele fazerem “plim”com as minhas. (como esta: o meu problema não é ser velho. é ter sido jovem). Curiosamente nunca li nada dele.

Tento descobrir mais títulos, nomeadamente, As confissões. Leio alguns títulos com a cabeça inclinada sobre o ombro direito. Inclino a cabeça para o lado contrário, lendo outros títulos que estão de pernas para o ar. Ah! E maravilha das maravilhas! Descubro As Mitologias de Roland Barthes.

Lembrei-me novamente do professor. A meio de uma aula pedi esclarecimentos sobre uma questão. E ele, pessoa sábia, completamente rendido à minha expressão de tão pura ignorância, perdoada, somente, por uma sede de saber enorme, poupa-me a uma humilhação vitalícia, evitando a pergunta directa ( Nunca leu …..?) pela pergunta subtil (Há quanto tempo não lê As Mitologias de Barthes?).


Mentalmente, somei mais uma obra à lista das futuras leituras. Resta-me apanhar a porta aberta.


Leonoreta

9 Comments:

Blogger Daniel Aladiah said...

Querida Leonor
Sentir que se pode ser como esse professor, deixando recordações tão positivas, é uma das grandes realizações profissionais.
Um beijo
Daniel

2:50 PM  
Anonymous Anonymous said...

desta vez tambem eu.Perdoe-me cara Leonor, mas talvez seja da hora.

O lugar do alfarrabista, no edifício da relação com a vida, (sei-o hoje), é uma representação de portas fechadas. Como quem capta o tempo, no amarelecer necessário das capas das histórias incontornáveis. Talvez os 50 anos passados, sejam o tempo da percepção, de que realmente, estamos perante um processo conotativo, (como quem vive) e a abordagem denotativa, seja tão só, um perfume que se esvai no ar...
Afinal, e como cantou uma vida o Sinatra...I’ve got you, under my skin...

8:04 AM  
Blogger Isamar said...

Também tenho um alfarrabista muito perto da minha casa. Há muitos anos. Com uma diferença: abre todos os dias as portas( duas), muito cedo e fecha tarde.De vez em quando compro lá uns livritos.Quanto aos que referes,tenho as Confissões e as obras completas de Óscar Wilde.
É tão interessante ler-te, minha amiga!Esta escrita tem muito a ver com a linguagem oral. Como é possível? Até parece que estás aqui ao lado, junto de mim.
Beijinhos. Muitos!

8:51 AM  
Blogger augustoM said...

Nós não temos futuras leituras, nem leituras passadas e, muito menos presentes, só temos leituras nos momentos certos, conforme as nossas necessidades. Podemos dizer, eu ainda não li a Bíblia, não se leu porque não achámos indispensável lê-la, as coisas só são lidas conforme a sua importância num dado momento. Também tenho alguns livros, muito bons, que nunca li, ainda não chegou a altura certa ou até poderá nunca chegar. Não fico muito preocupado por não ter lido um livro que é de leitura indispensável para outra pessoa. Quantas leituras fizemos no passado, que hoje não faríamos? Não faço a menor ideia do que irei ler no futuro. Hoje sei o que preciso ler, não amanhã.
Um beijo. Augusto

8:06 PM  
Blogger Zé-Viajante said...

Será que abre também a um Domingo ?

Abraços. Zé

9:51 PM  
Blogger . said...

Eu ler..hummm só quando por acaso abro um livro e me interesso por ele..mas raramente acontece..por acaso esse do retrato gostei principalmente pela parte de poder ser jovem pra sempre. :D Mas é dos poucos que posso falar... :S

2:26 PM  
Blogger deep said...

confesso que não tenho um código escrito na poeira das capas desses teus livros. não me converto facilmente, até porque o alfabeto é complexo para quem vem da noite e irrompe pela madrugada iluminada.
mas no folhear de horas que os dias deixam soltas, há sempre uma tempo para uma pausa nesta cidade agitada, deixando o corpo repousar na sombra que desponta...e é nesse momento que sinto o murmúrio das folhas agitadas na arvore que bebe a primavera nas linhas dos teus livros....

um abraço

1:52 PM  
Blogger Unknown said...

Agradeço a visita que fez ao http://www.cegueiralusa.blogspot.com/.
Temos um ponto em comum: a adoração pela literatura. «Rebento» o meu curto orçamento na aquisiçção de livros. Mas ... é por uma boa causa. Adoro ler e aprender...e quero, se possível, fazê-lo toda a vida.
Carreira.

12:28 AM  
Blogger Astri* said...

Tive um caso parecido. O meu professor de Filosofia sempre me disse "Raquel tu que até tens cabecinha, lê aquele livro vais ver que te vai fazer tanto bem e vai exclarecer tanta coisa". Pois bem nunca li os filhos da droga. é um livro que toda gente me fala que já leu, mas que também nunca o encontrei nas livrarias de cá. Porque se assim fosse comprava-o e lia-o. Pois bem. Ainda penso quando vejo o meu professor e cumprimento-o com um "bom dia/tarde senhor professor" :P (e ele odiava que se chama-se senhor.. LOL era sempre "professor") e lembro-me, de que forma é que ele pensa que aquele livro me vai exclarecer alguma coisa. Pois bem ainda o vou comprar e ler e depois terei a oportunidade de me exclarecer.

Pois bem minha querida Leonor, já com saudades, voltei.

Beijinhosssss

4:36 AM  

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