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Mínimo sou, mas quando ao Nada empresto a minha elementar realidade, o Nada é só o Resto. Reinaldo Ferreira

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Dizem que sou como o sol mas com nuvens como na Cornualha

Friday, September 29, 2006

De manhã começa o dia

Estamos a meio de Setembro e faz calor como se estivéssemos ainda no pico verão. Mas, de repente o clima muda. Trovões de me meter o cabelo em pé. Relâmpagos de me cortar a estática ao meio. A fúria da Física. Chove torrencialmente por breves segundos molhando-me completamente desde a porta da rua até à porta do carro.

No cacilheiro descanso, de corpo desconsolado a escorrer água. Os dez minutos da viagem depressa chegam ao fim e muito antes do barco atracar muita gente já se levantou para serem os primeiros a sairem. A camioneta e o metro não esperam.

Sou das últimas a sair. Detesto apertos. Aguento-me nos solavancos dados pelas ondas em passos estudados para não cair. À saída da estação fluvial, surpresa das surpresas. Todo o espaço que havia para alcançar a estação do comboio estava alagado com pelo menos vinte centímetros de água. São 8 horas da manhã.

Tenho mau acordar. Só começo a conviver pacificamente por volta das dez horas. Eu tinha acabado de sair da cama há uma hora e já começava a atravessar riachos de mochila às costas. Corri de um lado ao outro procurando uma brecha, à laia do Antigo Testamento quando Moisés foge com os judeus do Egipto. Mas não havia. Arrisquei. Atravessei uns cinco metros de água, horrorosamente gelada, encharcando as minhas sapatilhas keds, as minhas calças de ganga Miss Sixty até ao joelho . Felizmente não havia piranhas.

Sentei-me no comboio em direcção a Cascais. Fiz o resto da viagem até à escola, esperando, no mínimo, ver pela janela sardinhas voadoras. Mas não aconteceu mais nada. Foi-me dado tempo para disfrutar os meus pés encharcados até aos ossos.

Na volta, reparei na excelente estratégia arranjada para atravessar o lago: duas rampas de ferro apoiadas ao meio e às pontas por três armações de traves em madeira. No dia seguinte, as rampas continuavam lá, mas ligeiramente afastadas para o lado não fossem serem precisas nos tempos futuros.

Estamos na capital. O que diria Cesário Verde disto tudo, ele que gostava tanto de deambular por esta cidade.
da Leonor

31 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Desta vez Leonor, conseguiste o impossivel: fazer-me sorrir!
Imaginar-te de calças arregaçadas até aos joelhos, a saltar de uma pedra para a outra, a água gelada (e logo às 8 da madrugada, brrrrr!!!!), de mochila às costas (e tiveste sorte não haver piranhas, cobras de água, ou, pior ainda, uma pedra deslocada que te fizesse uma entorse e isso seria mais sério).
Mas as sapatilhas encharcadas e, presumo, o resto do corpo não deveria estar melhor quando chegaste à escola... claro, apareceu uma tossiqueira e como sempre não te tratas.
Boa semana.
Vai mostrando a tua boa disposiçaõa...
Um abraço

10:55 AM  
Blogger António said...

Querida Leonor!
Olha que já não estamos no meio de Setembro...eh eh.
Uma viagem de casa para a escola em dia de temporal (mas sem piranhas...eh eh).
Cada vez mais a tua ironia prevalece sobre tudo o resto.
Não sei o que diria Cesário Verde.
Mas eu diria que na capital ou fora da capital, estamos no país do desenrasca e do remedeio.
As nações também tem genes?

Beijinhos

2:20 PM  
Blogger SilenceBox said...

O texto está fabuloso, fez-me levar a sentir tudo o que sentiste, até me arrepiei com os relâmpagos, a viagem de barco, as roupas encharcadas e coladas ao corpo, as poças de águas que chegam até aos joelhos... Que descrição, Leonor!
Agora, aproveita bem o fim de semana, descansa bem, aprecie bem o conforto da residencia ou então passeia num veiculo por entre os campos, desde que não te molhes! ;-)
Muitos beijinhos!

5:28 PM  
Blogger Leticia Gabian said...

Por aqui o tempo é pior do que no inverno propriamente dito. Imaginei o frio nos seus pés indo aos ossos. Tadinha. Era mesmo capaz de ver sardinhas voadoras.
Beijão pra ti, querida.

5:31 PM  
Blogger Mocho Falante said...

e pronto lá vem a velha máxima do portuga ser bom no desenrasca!!!! Mas para quando é que vamos ter competentes e seres pensantes

Beijocas

Ps: Espero não teres herdado uma gripe

6:18 PM  
Blogger Pitanga Doce said...

Olha, eu já fiquei presa no sub-solo da estação do metro, e a água a descer pelas escadas a baixo e o dia se fazendo noite. Digno de um filme de terror. Coisas de cidade grande.

beijinhos

7:25 PM  
Anonymous Anonymous said...

Bom dia Leonoretta

Muito mais interessante do que saber o que diria o Cesário Verde, já que hoje isso seria uma abstracção, é ler-te na tua divina capacidade de relacionar os factos mais desgarrados da vida.

Sempre defendi que na vida, tudo se relaciona. Poucas pessoas tenho encontrado com a capacidade de o demonstrar como tu. Fantástico!

Optimo fim de semana e beijinhos para ti e para os teus homens.

Ana Joana

12:55 PM  
Blogger APC said...

Eheheheh... Também eu fui surpreendida por uma carga de água, a caminho do meu local de formação (Porto, quinta-feira p'las 8), quando decidira ir a pé para disfrutar do percurso. Resultado: o ameaço de gripe que já levava daqui concretizou-se!
Gosto dessa tua veia contestatária, e de expressões como "relâmpagos de me cortar a estática ao meio" que me prantam um sorriso no rosto. Ler sobre o teu mau acordar tem o mesmo efeito, porque conheço-me nessa figura e não sei como há gente que desperta tão disposto a tudo; preciso do meu casulo durante um bom par de horas também.
Quanto à história... Eheheheh, vá lá... Não sejas má... Então não é tão giro termos uma cidade cheia de pequenas lagoas, piscinas naturais e riachos rua afora assim que caem as primeiras águas?
Anda lá, que um dia queremos relembrar como é chapinhar numa poça de água e não podemos nem sair de casa, que a saúde não deixa - ou os técnicos do lar!:-(
Isto sou eu a ver se te convenço a mim e a ti de uma só leva!:-)
Leva um beijinho!

4:35 PM  
Anonymous Anonymous said...

Muito bom texto, o dia a dia de corrida entre as chuvas e os transportes, acontece-me muitas vezes aqui na zona de Cascais tomar duche dado pelos automobilistas que nem sequer olham para os peões e lá sai uma piranha para o fogo :))).
Gostei e vou voltar para sorrir, porque neste texto senti-me retratada.

boa semana de trabalho
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9:48 PM  
Blogger Fragmentos Betty Martins said...

Minha querida Leonor

Já voltei!!!

Estou a fazer uma visita a todos. Passarei mais tarde para te ler.

Beijinhos e carinho - muito

11:06 PM  
Blogger BÓLICE said...

DondÉ anden los poÉtas... poÉtas Andaluces... dÉ ahora...


... sÉ parecen quÉ estan...

...solos

=D

1:26 AM  
Blogger augustoM said...

Leonor não deves esquecer que somos um país de marinheiros e que as botas de água fazem parte da idumentária.
Um beijo. Augusto

1:30 PM  
Blogger Barão da Tróia II said...

Mais um texto extraordinário. Boa semana

1:51 PM  
Blogger Zé-Viajante said...

Diría, talvez, que era um Portugal desconhecido e que não se sentia bem nele. Fosse com calças enxutas ou encharcadas...

3:32 PM  
Blogger O Lápis said...

Oh Leonor se tivesses levado umas barbatanas na mochila, decerto ainda terias conseguido beber um café com um qualquer peixe espada, que ali passasse :)

Uma Lisboa desassossegada onde ninguem percebe bem quando as obras são para melhorar ou para agitar.

Neste caso os teus pés.
E também as nossas cabeças.

E depois disso tudo, dizer um bom dia para as crianças :) e fazer do dia uma caminhada gratificante.

Elogio-te o espirito :)


Beijo


PS-desta vez não há final insolito, a não ser o que possa advir da aprendizagem :))


Van

4:14 PM  
Blogger António said...

Obrigado pela visita, querida Leonor!
Eu tinha avisado logo no primeiro comentário que fiz a mim próprio:
Reproduzo:
"Eu sei que esta 1ª parte é essencialmente descritiva e muito chata!
Está assim propositadamente para que os leitores que pretendam recordar alguns elementos fundamentais os possam encontrar facilmente no início.
Mas não se amofinem nem desistam porque isto vai animar muito em breve."
Eça!
Ai se eu fosse o Eça!
Não estava a escrever coisas tão trabalhosas para um blog.

Beijinhos

9:01 PM  
Anonymous Anonymous said...

Texto leve e descontraído!
Bjs

10:34 PM  
Blogger Maria Carvalho said...

Excelente!! Muitos beijos meus.

3:31 PM  
Blogger Aldina Duarte said...

Tive mau acordar durante 37 anos, 21 deles a fumar, há dois que parei e acordo sempre bem?!

Até smepre!

7:53 PM  
Blogger Vanda said...

Então ambas temos o mesmo herói o Joao sem medo? :)

Adorei!

Passei-me e olha que já era bem crescidinha quando o "descobri"

Beijos e bom dia para ti! :)

1:03 AM  
Blogger Fragmentos Betty Martins said...

Minha querida Leonor

Tu é que não viste as piranhas - mas elas andavam por lá!!!

Fizeste-me rir:)))

Beijinhos grandes

6:00 PM  
Anonymous Anonymous said...

Bem, ou mal é realmente de manhã que se começa o Dia, esse não foi precisamente o melhor inicio, porque o ficar completamente encharcada, é altamente desagradavél e desconfortavel, ainda para mais, assim ter que se manter ao longo do dia.
Agora as obras que decorrem na cidade, tambem teem o incoveniente de acrescentar dificuldade ao mau tempo, mas enfim é o que temos, melhor sorte para os proximos incios de dia.
Bom fim de semana.

JMC

12:00 PM  
Blogger Velutha said...

O Outono trouxe a chuva e com ela estas histórias. Tantas vezes enregelada pela chuva, passei o dia a trabalhar!
Gostei do teu post.
Beijinhos e bom feriado.

12:34 PM  
Blogger António said...

Querida Leonor!
A partir de metade da parte II, a leitura de "Uma família burguesa" será muito mais fácil pois a estou a escrever quasi totalmente em discurso directo.

Beijinhos

1:01 PM  
Blogger magarça said...

Belo passeio à chuva :)

7:45 PM  
Blogger Luna said...

Ainda bem que o sol voltou
beijos

8:00 PM  
Blogger Leonor said...

PARA JMC

ainda no outro dia ouvi uma entrevista na televisao com maria filomena monica, uma mulher que nao hesita que os portugueses ouvem e calam. quando posso, reclamo e chateio ate conseguir o que quero... quando posso. porem ha outras coisas que uma pessoa so nao consegue.
é como o JMC diz, é o que temos.

abraço da leonoreta e obrigado pela visita sempre assidua da sua parte.

9:12 PM  
Blogger Leonor said...

PARA ANA JOANA

oh ana... achas mesmo que eu consigo relacionar as coisas. contudo, nem sempre ha resultados. quando os ha, custaram tanto.... rsss

mas se tu achas eu acredito.

beijinhos da leonoreta

9:14 PM  
Blogger António said...

Querida Leonor!
Eu referia-me a este teu comentário anterior:
"é verdade! a apresentação do cenario é fatigante! para quem lê e para quem escreve. trabalhosa. minuciosa. eça. completamente.
excelente. eu levaria semanas para consegui-lo. é por isso que os meus contos têm três personagens, rsss, o heroi, o adversario e o adjuvante.
abraço da leonoreta".

Beijinhos

9:31 PM  
Blogger alice said...

querida leonor,

depois do comentário do meu querido amigo josé gomes, só me resta pedir-te que escrevas um post sobre outubro, precisamos de te ler, és genial, obrigada

um grande beijinho,

alice

12:09 PM  
Blogger Daniel Aladiah said...

Querida Leonor
Professora sofre... (com sotaque brasileiro).
Um beijo
Daniel

7:10 PM  

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