Atrás de Emilio
Nos primórdios da antropologia, alguns nomes conceituados da referida ciência, que não quero aqui revelar por várias razões, sendo uma delas a minha ignorância parcial sobre o assunto, escreviam sobre o conceito de cultura, dando como exemplo vivências de certos povos, sem nunca saírem do gabinete. Até que um dia, alguém se lembrou de abrir a janela do referido gabinete e ver que havia mundo lá fora, decidindo sair pela porta para escrever sobre os Papua da Nova Guiné. Hoje em dia sabemos mais sobre a vida dos Papua que propriamente quantas marcas de detergente para a louça há no supermercado.
Depois de um ano difícil em que trabalhei e ainda estudei, ainda me encontro, no mês de Agosto, a trabalhar numa proposta de dissertação que Bolonha estipulou para cinco páginas no mínimo com entrega em data marcada. Copiando os primeiros antropólogos elaborei a proposta no meu gabinete e do meu gabinete eu fundamentei as larachas que quero impingir com alguns artigos de opinião pesquisados na Internet, onde vinha mencionada bibliografia. Depois ia desanuviar a cabeça para a praia.
Todavia, nunca encontrei a editora de Emilo ou da educação de Jean Jacques Rousseau.
À laia de Bolonha, mandei o meu trabalho por mail à minha orientadora que mandou logo um RE, dizendo: Levante-se da cadeira (não era bem assim que ela queria dizer) saia de casa e procure o livro nas bibliotecas ou em qualquer livraria.
Na Fnac não havia e na Bertrand nem constava nos catálogos on line.
- Quais são as probabilidades de haver um exemplar caido atrás da estante?- perguntei.
- Nenhumas. - responderam-me de forma tão peremptória que nem insisti.
Na Fnac não havia e na Bertrand nem constava nos catálogos on line.
- Quais são as probabilidades de haver um exemplar caido atrás da estante?- perguntei.
- Nenhumas. - responderam-me de forma tão peremptória que nem insisti.
No dia a seguir levantei-me cedo. O barco ia vazio, o metro ia vazio e tudo na universidade estava fechado menos a biblioteca e a tesouraria. Perguntei por Emílio à senhora do balcão e pela cota fui à procura dele. Encontrei-o em dois volumes magrinhos, já muito sarrabecos de folhas amarelo torrado. É provável que tenha sido um dos primeiros livros a povoarem as prateleiras daquela universidade.
Verifiquei que as lombadas tinham uma bola vermelha. Não podia levá-los portanto e esquecer-me deles na minha estante para fingir que os lia. Sei onde se coloca o chip que me denunciaria à saída se eu os enfiasse dentro da mala mas essa coisa chamada consciência, que nem Freud soube lá muito bem o que era, atrapalhou-me a acção. A reprografia estava de férias e só me restava comprar um cartão na tesouraria e meter as mãos à obra.
Por quatro vezes solicitei a ajuda preciosa (contrariada a partir do segundo chamamento) da senhora do balcão. A máquina não tinha folhas, a máquina reduzia-me as letras, a máquina copiava dos dois lados, debitando-me logo duas fotocopias de uma vez, a máquina tirava-me as fotocopias pretas. Aiiiiiiiiiiiiiiiii que nervos.
Gastei um cartão de cem fotocópias e a senhora do balcão nunca trabalhou tanto num dia de Agosto (em que toda a gente está de férias) como naquele dia.
Leonoreta
15 Comments:
Importante que tenha conseguido o livro pretendido. Ou seja segundo o título do post "Atrás de Emílio", com alguma dificuldade conseguiu encontrá-lo. Beijinhos
Raul
Minha querida eu entendo-te tão bem. Já passei por muitas trapalhadas dessas. Agora, felizmente, só faço o que me apetece (quase). Mas se precisares de ajuda de um antropólogo de excelência vai ao blogue "Os Tempos que Correm" e pede ajuda ao autor. É do melhor que há na nossa praça e muito prestativo.
Um beijo
O sereno cobre o manto verde da ilha, a suave brisa que percorre os campos espalha o incontido aroma doce das uvas que o sol tinge de carmesim, no tempo presa à ilha ficaste, tanto mar!
Beijinho
Que " maldade " fazer a senhora tirar tantas fotocopias em mês de Agosto, ou mês de " fare nienti ".
(É assim que diz, não é? )
Abraços e boa praia.
És blog 5 estrelas.Passa lá por casa.Votei no teu blog mas não tens de aderir.
Beijinhos
Só psssei mesmo para dizer olá. Hoje foi uma manha dificil ou facil...nem sei!!! :D
ps:bons sonhos
...vivências...
E lá puseste duas a trabalhar em Agosto. Sem gosto.Mas arranjaste o teu Emílio.
Beijinhos
Desejo-te um bom dia e uma boa semana.
Beijinhos
Estou em franca recuperação deste longo e bom periodo de férias, volto depois para por a escrita/comentários em dia.
Boa semana.
JMC
encontraste o emilio e agora reza para a orientadora não ler isto e ficar a saber que te querias esquivar ao pobre do emilio!!
beijos e vê lá se descansas que daqui a poucos dias estaremos de volta ao batente!!
Duas luas são os teus olhos
Dois rostos tem, a saudade
Dois actos, tem a peça de nome paixão
Nenhum aplauso dura...a eternidade...
Profético beijo
O Emílio sabe fazer-se difícil! Lembro-me que no curso a turma inteira o leu em espanhol. A esposa do professor era espanhola e trouxe-o de lá. Não encontrámos a tradução portuguesa. Foi uma experiência terrível!
Leonor, doce menina e querida amiguinha
venho sempre, sento-me e leio-te com a mesma ansiedade de sempre. com carinho, serenamente deixo-me estar até quase decorar os teus textos. leio e releio sem me cansar.
que trabalhão para ferias, não as fotocopias pois quem está à frente de algo está para fazer o que tem que ser feito. mas um trabalho desses de pesquisa e em Agosto é obra
O Emílio de Rousseau, - criança auto-suficiente
"É preciso estudar a sociedade pelos homens, e os homens pela sociedade. Os que quiserem tratar separadamente a política e a moral não compreenderão nunca nada das duas."
o importante é que o Emílio foi encontrado e a proposta de Bolonha bem elaborada certamente. nota 20 minha doce amiga
comento atrasada, mas com prazer e dizer-te que estou sempre
abraço-te com a mesma ternura, com o meu carinho, pois é mesmo um abraço forte que te quero dar
beijos
lena
Sentiste-te, portanto, uma perfeita "Argonauta" numa difícil expedição nesse "Pacífico" Agosto, qual Malinowsky (um dos meus preferidos, exactamente porque dos primeiros a "sair do gabinete")!
Bela moral... Efectivamente, andamos a esquecer-nos que "ir" por vezes é mesmo o melhor remédio!
Gostei muito! :-)))
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