Um tudo quase nada
Estou na minha casa. Mas ainda não é de vez. A médica deu-me oito dias para me recompor novamente da minha entropia orgânica. Já não sei se é físico, ou psicológico, ou físico e psicológico. Como diria Leonard Wiberly: o erro pode ser seu, ou meu, ou nosso.
Quando entro no consultório chego tão fraca que nem força tenho para falar. Não preciso. A médica começa a sua verificação de ataque quando alguém está “moribumdum” ( o estado anterior a Rigor Mortis). Vê-me o pulso, a dilatação da menina do olho, a língua. Sussurro trinta e três. Ela passa-me uma, duas, três receitas.
Longe, não sei onde, oiço a Ana: tu só precisas de um tornedó mal passado e de ouvir “Love me do” dos Beatles (li isto num livro de J. K Jerome, Três homens num bote e nunca mais me esqueci.).
Saio do consultório a cambalear ajudada pela segurança inabalável da parede do corredor. Carimbo as receitas e o atestado para oito dias. O ar da rua sem o cheiro fétido das queixas dos utentes sobre o sistema de saúde acorda-me de rompante para a surpresa da realidade. Olho o relógio. Cinco e meia. Tenho meia hora. Tiro o carro do estacionamento de marcha à ré sem olhar para trás. Faço a descida mais ou menos a uns oitenta km por hora. Vejo o semáforo mudar de verde para amarelo e de amarelo para vermelho. Passa rápido! Nem sinais da polícia e se ela aparecer logo se vê!
Chego a casa. Mas não a minha casa. Subo a correr as escadas que levam ao salão. Leva-me à gare? O sogro larga tudo. Pego na minha mala como está. Deixo para trás a escova do cabelo, o secador e o creme hidratante com que costumo enganar-me ao espelho. Apanho a camioneta para Lisboa no último minuto.
Estou na minha casa. Mas ainda não é de vez. Os oito dias estão quase passados. A desorganização orgânica continua. Moribundo, moribundi, moribundum. Ou será moribundo, moribundae, moribundam?
Quando entro no consultório chego tão fraca que nem força tenho para falar. Não preciso. A médica começa a sua verificação de ataque quando alguém está “moribumdum” ( o estado anterior a Rigor Mortis). Vê-me o pulso, a dilatação da menina do olho, a língua. Sussurro trinta e três. Ela passa-me uma, duas, três receitas.
Longe, não sei onde, oiço a Ana: tu só precisas de um tornedó mal passado e de ouvir “Love me do” dos Beatles (li isto num livro de J. K Jerome, Três homens num bote e nunca mais me esqueci.).
Saio do consultório a cambalear ajudada pela segurança inabalável da parede do corredor. Carimbo as receitas e o atestado para oito dias. O ar da rua sem o cheiro fétido das queixas dos utentes sobre o sistema de saúde acorda-me de rompante para a surpresa da realidade. Olho o relógio. Cinco e meia. Tenho meia hora. Tiro o carro do estacionamento de marcha à ré sem olhar para trás. Faço a descida mais ou menos a uns oitenta km por hora. Vejo o semáforo mudar de verde para amarelo e de amarelo para vermelho. Passa rápido! Nem sinais da polícia e se ela aparecer logo se vê!
Chego a casa. Mas não a minha casa. Subo a correr as escadas que levam ao salão. Leva-me à gare? O sogro larga tudo. Pego na minha mala como está. Deixo para trás a escova do cabelo, o secador e o creme hidratante com que costumo enganar-me ao espelho. Apanho a camioneta para Lisboa no último minuto.
Estou na minha casa. Mas ainda não é de vez. Os oito dias estão quase passados. A desorganização orgânica continua. Moribundo, moribundi, moribundum. Ou será moribundo, moribundae, moribundam?
Sento-me à secretária no meu canto da janela. A minha árvore está repleta de folhas. Este ano dei por elas todas de repente.
Ana olha para mim com um sorriso cheio de paciência.
- Está quase! – arrisca ela ao meu pensamento.
- Oh Ana! O quase quase nada pode ser um quase quase tudo.
- E essa leste onde? – perguntou rindo.
- Numa canção do Paulo Gonzo, acho eu.
- Não é bem assim mas também pode ser.
Da Leonor
Ana olha para mim com um sorriso cheio de paciência.
- Está quase! – arrisca ela ao meu pensamento.
- Oh Ana! O quase quase nada pode ser um quase quase tudo.
- E essa leste onde? – perguntou rindo.
- Numa canção do Paulo Gonzo, acho eu.
- Não é bem assim mas também pode ser.
Da Leonor
23 Comments:
Estou a ver que este ano lectivo, que agora se aproxima do fim, está a deixa-la arrasada, pode ser que com o fim á vista, a ansiedade aumente, e fique ainda mais fragilizada, mas, tem de haver mais um pouco de espirito positivo de sacrificio e depois, dentro de alguns meses verá que afinal até teve algo de positivo e enriquecedor, deve ser para si o mesmo que ter cumprido um pequeno serviço militar (mas sem arma), vai concerteza lembrar-se das historias passadas (algumas já partilhadas, aqui), de pessoas com quem conviveu e de possiveis amizades que entretando foram criadas e então 'Um nada quase tudo', vai chegar.
Bom fim de semana.
JMC
Querida Leonor!
Um texto de cariz muito pessoal, sem ser intimista.
Uma boa linguagem e o habitual humor.
Muito bem, minha amiga!
Beijinhos
Minha querida Leonor
Estás doente?
Ao que parece, pelo que acabei de ler neste teu post, não estás muito bem!!! :((
Também deve ser cansaço, estamos no final do ano lectivo.
Desejo que fiques bem rapidamente e que volte tudo ao normal na tua vida.
Beijos com muito carinho
querida leonor,
fiquei preocupada com este post
então tens estado menos bem?
espero que não seja nada grave
nada como um bom descanso agora
um grande beijinho e os meus melhores pensamentos
alice
Querida Leonor
As doenças multiplicam-se na relação directa de tudo e de quase nada... mas essa escrita melancólica foi o maior sintoma de que te falta mesmo "estroinar" (lindo verbo!) um pouco e saltar adiante.
As melhoras...
Um beijo
Daniel
O quase tudo é o mesmo que o quase nada, depende do ponto de vista.
Espero que a tua doença seja um quase nada.
Um beijo. Augusto
para JMC
a sua análise do meu fim de ano é perfeita.
abraço da leonoreta
Lindo nome, bela idade, bom signo, excelente blog!!!
Ainda só li um texto (era suposto eu estar a trabalhar!), mas tenho já a certeza de que lerei todos :-)
Bem-haja(s) & prontas e definitivas melhoras, com um abraço!
PS - Cheguei aqui através de uma Alexandre Sousa, que, aparentemente, terá visitado ambos os nosso cantinhos.
'Um nada quase tudo', querida Leonor pode bem ser um principio de um quase tudo,
o ano está a chegar ao fim, o stress não é bom conselheiro, a fragilidade toma conta de tudo e quando menos se espera o tudo acontece,
tenta descansar, se oito dias não chegam fica quinze,
está tudo pronto praticamente, falta a despedida e sei que custa na altura das renovações das matriculas e das avaliações,
já tudo está praticamente feito, não deixes que a emoção tome conta da tua fragilidade, eu sei que é bom dizer o pior é quem passa por isso
descansa por favor é um pedido de quem sabe o que lhe aconteceu
o meu beijo para ti e um abraço com muita ternura, minha doce e linda amiga
lena
Bela Leonoretta,
Somos os unicos responsáveis pela gestão das nossas vidas. Acredito que o somos desde sempre. As escolhas que fazemos são totalmente da nossa responsabilidade. Assim e contrariando Leonard Wiberly, o erro só pode ser "meu" ( ou teu neste caso). É domingo, dia "santo de guarda". Dia supostamente de paz, como de paz queremos que sejam todos os nossos dias. Seja em que casa for.
Vai lá comer o tornedó mal passado e olha pra ti com olhos de paixão. Enquanto não te apaixonares por ti, minha linda, não haverá "segurança inabalável da parede do corredor" que seja suficientemente segura e inabalável. Nem o universo será suficiente.
Já é tempo de pores a Leonor a fazer uma verdadeira reciclagem para que perceba o que vale realmente a pena. A Ana está prá ajudar. Nós todos, aqui e acolá, para te reconhecer o valor e o prazer de te termos no mundo. Porque tu, VALES MUITO A PENA.
Beijinhos e uma rica semana
Ana Joana
para Ana Joana
Penso que a Leonor sabe muito bem o que quer e o que pensa.
a sua eterna crise advém do facto da grande vontade de querer ser ubíqua e não poder sê-lo.
por outro lado, muitas vezes na sua criação de textos algumas palavras aparecem apenas pela tentativa da metáfora.
como na poesia quando se procura a palavra para fazer a rima.
é autor e personagem cada um para seu lado, rsss
beijinhos da leonoreta
Passei por aqui e deixo o meu voto de boas melhoras. Já está a chegar o descanso merecido ao fim dum ano intenso. Acredito que as saudades vão ser de parte a parte. As crianças dão-nos muito!
Fica bem, depressa. Ergue a cabeça respira fundo e segue em frente. Ah! Continua a escrever aqui.
Parabéns! O optimisto deve ser sempre a nossa bandeira...
Querida Leonor!
Só quero agradecer o comentário tão generoso que deixaste no meu último post.
Beijinhos
as melhoras! vais ver que no fim do mês vais ficar milagrosamente curada e não te cobro nada por esta consulta!!
andas doente Leonoreta???
Espero que estejas melhor é que ler estes teus textos deixam-me encantado
beijocas e as melhoras
Ó vizinha Leonoreta, espero que esteja melhor. Então logo agora que eu queria convidá-la para uma sardinhada...
Leonor, o texto, sempre gostoso de se ler. Quanto à tua saúde... peço a Deus que estejas melhor, amiga querida. Tudo de bom para ti e para o VP.
Queridas Leonor
Como é que estás?
Espero que já estejas bem mrlhor:))
Beijinhos cheios de carinho
BomFsemana
O final de ano lectivo está a chegar! O retempero de forças chegará. Espero que seja passageira e que voltes às tuas lides com a pujança que te caracteriza.As melhoras. Bjs
Se olhares para o copo e me disseres que está meio cheio dou-te um sorriso.
Se me disseres que o VP o acabará de encher, tens um beijo imenso.
Se me sorrires, depois de tudo, prometo que vou buscar outro copo. Dividimos uma parte da agua pelos dois. Bebemos, gargarejamos, vais desatar a rir e eu também pela figurinha que vamos fazer as duas.
E depois, agora sim, a parte mais deliciosa. Vamos buscar detergente da louça, dois carrinhos de linha de qualquer cor :-) e molhamos o carrinho naquela mistela e sopramos.
Gostas de bolas de sabão?
Eu desgraçava os carrinhos de linhas à minha mãe, mas, digo-te, para além de ficar com a boca a arder (rsss) era uma delícia ver as bolinhas multicolores.
Vês que te fiz rir?
Beijitos, Linda *******
Vá, meu doce! Sempre esse copo meio cheio, ok?
este texto deixou-me preocupada!Espero que já estejas boa!
Tens de descansar plenamente... As férias dos professores já estão à vista... tens que aproveitar bem estes dias, cuidar de ti, da tua saude, pensando também tudo com optimismo e nas coisas belas e positivas.
Um abraço carinhoso
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