A Tragédia
Ora o tempo me falta ora o tempo me sobra, aquele tempo que não existe e que por isso oscila consoante o meu estado de espírito do muito querer fazer e do nada querer.
Nestes dias sobrou-me uma hora de tempo. Entro na biblioteca. Escolho um corredor. Percorro as prateleiras com os olhos à procura de um título, de um autor que se transforme no título, no autor. Tropeço em Édipo Rei. Não resisto. É o eterno fascínio pela tragédia.
As personagens de alta estirpe que, estoicamente, suportam os cinco passos da tragédia que culminam na catástrofe, mostrando ao mais comum dos mortais - eu - que se a desgraça lhes acontece, o problema dele, do mais comum dos mortais - eu - não vale nada.
Na tragédia começa a teoria da catarse. Os desafios ao destino (hybris) e o “sofrimento por eles sofrido” (pathos) – com perdão do pleonasmo – purificam a alma de quem os assiste.
Segundo Agostinho da Silva, Édipo “rema contra a maré a favor da maré”: ao fugir da sentença do oráculo que o condenava cruelmente a matar o pai e a desposar a mãe ele irá matar o pai e desposar a mãe sem o saber e sem o desejar, particularmente, numa sociedade que abominava tais casamentos.
Olho o relógio. Arrumo o livro. Toda a minha angústia de ocupar um tempo com nada querer fazer se dissipou perante a tragédia de Édipo. Brevemente comprarei um exemplar para andar sempre de alma lavada com ele no bolso.
As personagens de alta estirpe que, estoicamente, suportam os cinco passos da tragédia que culminam na catástrofe, mostrando ao mais comum dos mortais - eu - que se a desgraça lhes acontece, o problema dele, do mais comum dos mortais - eu - não vale nada.
Na tragédia começa a teoria da catarse. Os desafios ao destino (hybris) e o “sofrimento por eles sofrido” (pathos) – com perdão do pleonasmo – purificam a alma de quem os assiste.
Segundo Agostinho da Silva, Édipo “rema contra a maré a favor da maré”: ao fugir da sentença do oráculo que o condenava cruelmente a matar o pai e a desposar a mãe ele irá matar o pai e desposar a mãe sem o saber e sem o desejar, particularmente, numa sociedade que abominava tais casamentos.
Olho o relógio. Arrumo o livro. Toda a minha angústia de ocupar um tempo com nada querer fazer se dissipou perante a tragédia de Édipo. Brevemente comprarei um exemplar para andar sempre de alma lavada com ele no bolso.
da Leonor
33 Comments:
Um livro no bolso é sempre uma boa companhia. Sentas-te na mesa do café, acompanhada, vais para a escola, acompanhada, deitas-te , acompanhada...
Seja em que circunstância for nunca te deixa ficar sozinha ainda que tenhas que o reler.
Já Petrarca dizia que os livros eram os nossos melhores amigos.
Beijinhos
Verdade! Para nos lembrarmos de que nada valem pequeninas coisas transformadas em enormes na nossa imaginação!! Como sempre gostei de te ler. Bom fim de semana, beijinhos.
Pelo que se pode concluír, parece que ainda ha horas que podem ser bem aproveitadas e ainda servem, para nos transmitirem mais alguns conhecimentos e finalmente, o conselho de ter sempre um bom livro á mão.
Bom fim de semana.
JMC
O tempo. quando temos tempo, temos uma vontade inerte de fazer coisas...
quando não temos o tempo, a vontade de as fazer é muita! enfim...
eu levo sempre um livro comigo, para o caso de ter vontade de o ler, dentro do tempo disponivel.
bom fim de semana!
beijinhos
"Qual é o animal que tem quatro patas de manhã, duas ao meio-dia e três à noite?"
Como em Brecht, falamos dos rios e esquecemos as margens. Mas também aqui, ainda hoje não sei, se o desejo de Jocasta, não nasceu nos pés furados pelos pregos às mãos de Laio. Com ou sem Oráculo, há sempre um monte Citeron, na vida de cada um. E è nessa solidão, que faz bastante falta o livrinho de bolso..,
Leonor
Como sempre, textos com certa pedagogia e que simultaneamente nos dão o prazer de uma agradável leitura!
Amiga Leonor, que tenhas um lindo fim de semana!
Bjs
para jmc
olá JMC. e cá estamos nós a continuar as nossas rotinas. nem parece que já estamos num ano novo que se prolonga indefinidamente sem aquela dictomia entre dia 31 e dia 1.
mas ainda bem.
abraço da leonoreta
PARA ANÓNIMO
será......o homem?
talvez sim mas talvez não.
a pitonisa, completamente drogada, tinha destas interrogações que deixavam os gregos completamente à nora no seu mundo cosmogónico onde a palavra não podia ir para além do seu referencial.
mas essa era uma questão dos gregos. agora temos outras.
leonoreta
Leonor de mansinho entrei para te ler hoje, já me fui encantar com o mar, apesar da chuva miudinha, mas isso é minha forma de começar cada dia
entrei, com disse e encantei-me de novo nestes teu ex improviso, tropeço no "fascínio pela tragédia"
uma obra prima da tragédia grega, a impotência humana diante do destino...
o tempo é o nosso tempo, é o tempo que lhe quisermos dar
um livro é um bom companheiro desse tempo
sem contar o tempo que o tempo tem, sento-me neste teu cantinho delicio-me, gosto muito de te ler doce Leonor
não podia deixar de perguntar como vão os teus meninos, depois destas "mini férias" vêm sempre com enormes surpresas
um beijo para eles
a ti abraço-te como sempre, com muita ternura e deixo-te um beijinho meu
lena
Querida Leonor!
Um texto bem estruturado e de agradável leitura, apesar de tocar em temas que, se desenvolvidos, dariam (aliás, tem dado ao longo dos tempos) pano para muitas mangas.
Mas não pude deixar de pensar que há uma coisa chamada complexo de Édipo que também parece ser causadora de algumas tragédias nos tempos que correm.
Boas leituras de bolso nos transportes públicos. E às vezes uma viagem com grandes atrasos até pode ser uma benção dos deuses...gregos.
Beijinhos
Leonoreta: agradeço a visita à "minha" Inês de Castro, uma história de amor sempre na memória de muitas pessoas...
Como não sou uma pessoa que tem um livro na mesinha de cabeceira, o que é imperdoável... lá vou contando as "histórias" no meu blog, até que um dia elas acabem...
Um bom ano de 2007, com muita alegria e saúde.
Abraço
Querida Leonor!
Venho só agradecer a tua visita e comentário ao meu post d'"A mulher à janela".
Beijinhos
Enigmáticas profecias auto-realizáveis: se não as conhecesses, não lutarias contra elas acabando por nelas cair!... Uma delícia de coincidências (porque o serão, no plano real, alvitro eu), que nos obrigam a um danado processo de pensamento contra-factual ("se tivesse sido assim"; "se eu tivesse feito assado", lol).
Sim, continuo blog-closed. Vim mesmo só ver-te! E como sempre gostei! :-) Tem um belo ano, boas leituras e melhoras escritas! :-)
Um abraço.
Uma hora de tempo tem 6o minutos ou 3600 segundos.
Que podem valer muito ou passarem despercebidos. Como sabes aproveitar os minutos e segundos aqui está um texto para ler e saborear.
Abraços
Só os Gregos seriam capazes de escrever tais tragédias, pois as suas vidas eram elas mesmo uma autêntica tragédia ao sabor dos caprichos dos deuses e do vaticinio do oráculo. Diziam-se livres, mas era mentira, talvez fosse o povo menos livre, pois o seu livre arbítrio dependia de terceiros.
Vamos ter mais um jantar, gostariamos muito de te ver por lá.
Um beijo. Augusto
Tragédia em época festiva de Reis... É sintoma, síndroma?... Agudo, crónico?... :)
Será que há mesmo destino? Ou serviria os interesses do oráculo?
E os prazeres da violação do tabu do incesto?
Um beijo
Daniel
Há, onde?
Jà não ia ninguém ao meu blog há meses, como é que me descobriste?
Cumps,
E há males que vêm por bem. A tragédia fez dissipar o estado de ansiedade em que te encontravas.E eu recuei no tempo. Há muitos anos, sentada no anfiteatro 2 da Faculdade de Letras de Lisboa, ouvia o meu saudoso Professor, Padre Manuel Antunes, falar de Sófocles, Eurípedes e Aristófanes com sapiência e eloquência. Quanto daria agora, Leonor, para o ver e ouvir! Mas li o que escreveste e soube-me tão bem!
Obrigada!
Beijinhos
Maria
O livro de bolso será uma companhia para as tuas viagens diárias de barco.
Gostei do teu relato (há mais de um mês, penso, que não tinha acesso ao teu blog) e já sentia saudades do teu estilo característico.
Que é que fizeste à musica que inserias no blog? Não ouço nada!!!
Tem um bom ano, amiga.
JG
Agora fizeste-me recordar os belos tempo de faculdade em que na cadeira de Teorias da Personalidade se discutia fervorosamente no módulo de Psicanálise o Édipo e o génio Freud que teorizou
Beijocas
Cara Leonor
É sempre agradável ler textos simples que nos ensinam, e que, efectivamente, parecem sair de improviso do lufa-lufa da vida agitada que levamos.
Vou poupar no tempo e arranjar tempo de sobra para conseguir ler todo este blog.
Resto de boa semana
PS:O brigado por ter vindo aforoar na minha arca.
Olá Leonoretta,
Na ultima semana tive o tempo que os "estafermococos" me ofereceram: caminha 24h/dia x 7.Ainda estou zonza e sem capacidade para decidir o que fazer com cada uma das 24h que estão agora à minha inteira disposição. Nem remar contra a favor nem a favor contra. Não remar. É mesmo um daqueles dias em que se torna bem oportuno acreditar que não vale a pena mexer porque o que tiver que acontecer, vai acontecer.(estou desenergisada)
Beijinhos
Ana Joana
Beijinhos e boa semana para ti
PARA ANA JOANA
pois é.
mas não remar já uma tomada de decisão e ela vai trazer consequências naquela teoria de causa e do efeito.
a vida é uma complicação que tem como objectivo só e só a preocupação da salvação.
beijinhos da leonoreta
Olá Leonoretta,
Já energisei rsss e já me permito discordar do objectivo unico da vida. É minha opinião que o nosso principal objectivo é sermos felizes - até hoje nunca ouvi ninguem dizer que fazia ou ía fazer isto ou aquilo para ser infeliz.
Pre+ocupações são essencialmente desperdicios de energia,cujo retorno só muitissimo esporadicamente se verifica - menos de 0,1%)
Assim, viver será tanto menos complicado quanto melhor soubermos gerir o gasto das nossas energias e qto melhor as soubermos aplicar (quando, onde e como).
Isto poderá querer dizer que se no jardim de infancia fosse ensinada ergonomia aplicada à vida, eventualmente teriamos pessoas mais competentes - logo mais felizes e eficazes - na vida adulta. Eventualmente teriamos um mundo melhor. rsssss
Esqueci-me de te deixar beijinhos rssss e de te desejar que não te pré-ocupes demasiado porque não vale a pena! rsss Cada dia devemos estar preparados para receber o resultado das nossas escolhas. Qto ao resto é..... remar contra a maré a favor da maré - já viste o desperdicio?????rsssss
pré-ocupações, pré-conceitos e outros pres, cegam-nos, escravatizam-nos, limitam-nos, condicionam-nos. E o mundo fica muito muito mais pequenino - o nosso mundo.
Beijinhos agora e um abre asas imenso
Ana Joana
PARA ANA JOANA
acho graça à maneira com sempre me viste...
eu não vivo assim tão preocupada, ou tão depressiva como sempre pensaste que eu andava, rss.
apenas gosto de falar de certos temas... podia ser a floribela que eu fiquei a conhecer na televisao no outro dia no restaurante porque em casa nao vejo televisao.
mas optei pelas dúvidas existenciais.
beijinhos da leonoreta
Alô Leonoretta rssssss
Estou mesmo a sorrir e a ver a tua carinha a dizer o que escreveste rssssss. Realmente, nós somos aquilo que achamos que somos e o que achamos que os outros pensam que somos. Ora, nem sempre e aliás com muita frequencia, enganamo-nos no que julgamos que os outros pensam de nós rsssssss.
Esta resposta que dei foi somente a manifestação da minha opinião em contraponto com a tua. Aqui não há certos nem errados - há filosofias de vida rsssss.
Um bom dia para ti e, uma certeza: és uma pessoa muito rica, muito criativa, muito emotiva, muito sensivel e inquieta e insegura.Este cozinhado por vezes é mais apurado do que outras rsssss. Vai do cru ao esturricado! Mas o que é mesmo mesmo mesmo verdade, é que me encanto com estes teus textos rssssss
Beijinhos
Ana Joana
Não me fui embora, estou só a fazer uma pausa por motivos profissionais e académicos e a retemperar forças para voltar á net com outros projectos.Considerando que tive uma passagem tão rápida pelos blogs, saber que há ainda alguém que se lembra de mim é muito bom... vou voltar a escrever qualquer coisa, ainda que o tempo não abunde...
Obrigado pela tua simpatia e deixa-me dizer-te que pelo que vi estás com uma escrita cada vez mais refinada ( decididamente não é de improviso :-) )
Beijos,
Alex
As minhas “tragédias” são maiores que as dos outros.
Talvez se substituísse o MP3 por uma tragédia de bolso, até poderia ser uma notícia recortada, as relativizasse, afinal nem são grande coisa.
Por outro lado, a ideia de andar acompanhado pela desgraça deprimir-me-ia. Talvez se a substituísse por uma realização notável me deixasse consciente do «tempo morto» e o utilizasse sofregamente na concretização da minha – frustração garantida –.
Opto pelo MP3 consciente da minha dimensão.
Tu, que partilhas fragmentos de paz, tristeza, descobertas... através das palavras, também partilhas inquietações. É sempre com o coração aberto que aqui chego, colocando a leitura em dia, sentado num cantinho aconchegante do teu sítio. Grato por tudo, amiga querida. Um beijo fraterno.
Particularmente um dos blogs mais recomendados e que atiçou minha curiosidade. Verifico hoje, verifico amanhã, finalmente cheguei. E não é que as minhas expectativas (boas!) foram superadas? Pois sim. Parabéns! Ganhaste mais um leitor... quando minha parceirinha der as caras por cá, certamente terás mais uma leitora. Até mais, cara Leonoretta.
és mau, sabes?
má. pensei em ti no masculino. :) não sei porquê o blog pica :)
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